[Nota – Sem prejuízo de novos textos, inicio a recuperação
das antigas publicações, agora reformuladas (corrigidas, revistas e,
eventualmente, aumentadas).
Aquela praia na curva do rio…
Mirar el río hecho de tiempo y
agua
y recordar que el tiempo es otro río,
saber que nos perdemos como el río
y que los rostros pasan como el agua. Jorge Luis Borges [1]
y recordar que el tiempo es otro río,
saber que nos perdemos como el río
y que los rostros pasan como el agua. Jorge Luis Borges [1]
O lugar
fig. 1
– Emilio Biel & C.ª – Porto. Vista para o Areinho.
Naquele calmo lugar onde se dilata “a paisagem pelo afastamento das collinas: as
aguas do rio, menos apertadas, expandem-se, simulando um lago, cuja superfície,
apenas encrespada, reflecte a imagem tremula das arvores, das casas e dos
montes” [2] o Douro corre, terso y mudo, mansamente,
[3] com a sabedoria de quem já esqueceu a sua longa viagem
desde o lugar onde nasceu.
O Douro que sabemos que Seguro
da tua grandeza, / Vens do início do tempo [4]
e
que porque
Passou por outras margens,
Diversas mais além,
Naquelas várias viagens
O Douro encontra aí, nesse
lugar, uma curva onde, como se procurasse descansar antes de - numa surpresa
- chegar à cidade que fez nascer.
E pela cidade passa - sem
preocupações - porque sabe que sem retorno, irá finalmente descansar no
oceano.
Rio abaixo
Este rio foi durante séculos a
estrada de transporte de produtos de todo o vale do Douro, destacando-se o
Vinho do Porto, transportado nos barcos rabelos.
fig. 2
– Foto Beleza, Barco rabelo a transportar pipas.
In Maria do Carmo Serém, Douro
Do Tua à Foz com a Fotografia Beleza. Lello Editores. Porto 2002.
Numa aguarela de Alberto de Souza [6],
vemos três rabelos de velas enfunadas, carregando as pipas de vinho, que ao
descer o Douro chegam às calmas águas do Areinho.
fig. 3
- Alberto Sousa (1880-1961), 1935.
Ou subindo o Douro no mesmo local.
fig. 4
– Postal Porto-Barco rabelo subindo o Rio Douro.
Mas pelo rio não se
transportava apenas do vinho, mas “cortiça,
casca, madeira, gente; e quando vem o inverno e anda o rio grande, o movimento
nunca se interrompe. Os homens intrépidos de pé sobre a pégada - o nome da
gaiola onde vai o arrais - manobram com precisão a espadela, metendo a charroa
na água e imprimindo a direcção ao barco.” [7]
fig. 5
– Postal. Porto. Barco recoveiro. Um rabão transportando várias mercadorias.
E assim no Douro navegavam não apenas o rabelo, mas ainda o rabão
negro e o rabão branco e o valboeiro - com ou sem toldo - e que serviam de
barcos de passagem, ou adaptando-se à pesca do sável, tomavam então o nome de
saveiro.
fig. 6
- William Morgan Kinsey (1788-1851) barcos do Douro in Portugal Illustrated Letters London, 1829.
“O rabão é o rabelo, mas tem como nota
característica principal a falta das apegadas. A espadela é mais curva, de
molde a poder ser governada do ensaio.” [8]
Com algumas variantes era denominado
de branco ou negro conforme era empregue no transporte de carga como estrume,
carqueja ou carvão.
E o “«saveiro», como o seu nome está a indicar, é o barco
usado para a pesca do sável, e tem seus portos naturais e tradicionais na
margem esquerda do Douro, na costa fluvial do concelho de Gaia (…) O saveiro,
é, na sua estrutura, idêntico ao rabelo, (…), porém muito mais pequeno.
Emquanto aquêle comporta
a tripulação e carga, (…) êste apenas se
destina, no máximo, a três homens, cuja indumentária tradicional é composta por
calça e camisa de flanela, boina ou carapuça de lã. [9]
Todos eles, rio abaixo, encontram
a cidade do Porto ao tornear esta tranquila curva onde “opéra o Douro uma
das suas subitas e surprendentes transformações. Expiram as collinas fronteiras
de uma e outra margem, interrompidas por um valle deliciosissimo, onde a
vegetação é mais abundante, mais povoadas as verduras, e onde se encorporam em
riachos as aguas escoadas dos proximos declives. Apreciam-se tão raros
intervallos, em que o Douro, o severo Douro, sorri, como se aprecia um raio
de alegria em rosto habitualmente carregado” [10].
O Areinho
Aí se forma uma praia chamada
de Areinho para onde Paulino de Cabral [11] “arrependido
o que perdera em largos anos de regalado epicurismo entre os leitões e as
compotas do conde de Alva e os amores suaves e repousados da doce Nize das
Fontainhas em cujo gentil regaço lhe era doce descançar, [espraiava] a
vista pelas bucólicas verduras do Areinho.” [12]
Este ambiente bucólico e
romântico sempre atraiu a atenção dos pintores do Porto.
fig. 7
- Jean Pillement, (1728-1808), Margens do rio Douro 52 x 66 cm. Museu Nacional
de Arte Antiga.
As tonalidades claras dão à composição uma encantadora poesia bucólica. As
modelações do terreno e a colocação de figuras em planos distintos, garantem a
profundidade de toda a composição e dão o pitoresco ao quadro.
Na margem esquerda onde “dormem
na praia os barcos pescadores” [14] – os
valboeiros que se distinguem pela sua proa empinada - três pescadores num
pequeno morro atarefam-se na pesca fluvial junto a uma árvore, um freixo (Fraxinus
angustifólia), esse “espesso
freixo, que rodeiam myrtos, [e que]
longe estendia a cúpula frondosa”. [15]
O conjunto formado pelos
barcos, pelo morro e pela árvore, fazem uma moldura que enquadra a paisagem do
rio.
Neste, sob uma luz matinal e
um céu azul de poucas nuvens, navegam tranquilamente quatro barcos, onde se
distingue um rabelo, “de larga vella enfunada, e espadella longa e esguia
estirando- se ao lume d'agua como a cauda de um cetáceo. [16]
Na margem
esquerda do Douro, a praia do Areinho tendo ao fundo a Quinta da Alegria. No
canto inferior direito, um banco de areia onde um pescador está acompanhado de
uma figura feminina que tem ao colo uma criança. Um cachorro reforça o ar
tranquilo e familiar da paisagem.
O Areinho na segunda invasão francesa 1809
No início do século XIX um outro acontecimento irá chamar a atenção para este lugar do rio Douro, já que foi neste lugar, neste baixio do Areinho, que em 1809 as forças anglo-portuguesas sob o comando de Arthur Wellesley [17] atravessaram estrategicamente o rio, surpreendendo o exército francês aquartelado no Porto.
E aquela curva é testemunha de
tudo o que há mais de duzentos anos aconteceu.
E mais um pedaço de história e
tradição foi acrescentado há vida do rio Douro.
António Joaquim de Mesquita e
Mello (1792 - 1884), que em criança assistiu a
estes acontecimentos, num poema intitulado O Porto invadido e libertado,
escrito em 1815, refere esse episódio da Guerra Peninsular, assinalando os
lugares onde teve palco:
(estrofe 65.º)
“A cada ponto marcha a
audaz columna,
De Avintes, Quebrantões, e
Villa-Nova…
E chegam junto ao Douro, onde
a fortuna
Com meigo riso sua vinda
aprova,
Verdadeira promessa de victoria,
Que não deixa o valor ser
illusoria.”
(estrofe 68.º)
“É Quebrantões de
interpidos o embarque,
Em que Wellesley vai com
galhardia,
Amedronta o Francez da Serra o
parque,
E para nós dá salvas
d’alegria;
Não tarda que o valor o Douro
abarque,
O Douro festival todo em
folia:
Eis chovem balas do sagaz
contrario,
O pintor suíço Henri L’Eveque [19] produziu duas gravuras, mostrando as forças anglo-portuguesas atravessando o Douro em 1809, num Álbum publicado em Londres em 1812.
Apesar de se tratar de
composições destinadas a elogiar a vitória sobre os franceses, elas reflectem
uma visão romântica própria do início do século XIX, sublinhando a beleza
natural do lugar.
fig. 8
- Henri l’Évêque, Passage of the Douro by the Division under the Command
of L.t Gen.l Sir John Murray:gravura n.º 6 in W. Campaigns of The British Army
in Portugal under the command of General the earl of Wellington, K.B.,
Commander in Chief &çc. &çc. Dedicated by Permission to His Lordship,
London printed by W. Bulmer and Co.
Cleveland-Row, St. James’s; and Published (for the Proprietor) by Messr.
Colnaghi and co. Cokspur-Street, Charing-Cross, 1812.
Sob um céu em que as nuvens conferem à gravura um certo dramatismo e contrastando
com a serenidade do rio e a beleza das suas margens, vê-se ao centro o Palácio
do Freixo com os seus terraços.
Na margem esquerda, na praia
do Areinho, as tropas comandadas pelo general Sir John Murray (c.1768-1827) [20] embarcam transportando cavalos e canhões. À esquerda
os freixos e o muro da quinta existente no local.
Na outra gravura, com uma
composição semelhante, o General Edward Paget [21] montado num cavalo branco e apontando para o norte,
comanda as tropas que se preparam para embarcar para a travessia do Douro
No rio navega um rabelo com a
vela cheia, transportando militares.
Na margem direita vê- se o
Seminário, quase uma ruína.
E mais para poente um fogo que
mostra a situação bélica da cidade do Porto.
fig. 9
- Henri L’Eveque, Passage of the Douro, by the division under the
Command of L.t Gen.l the Hon.ble Edward Paget. gravura n.º 7 in W. Campaigns of
The British Army in Portugalunder the command of General the earl of
Wellington, K.B., Commander in Chief &çc. &çc. Dedicated by Permission
to His Lordship, London printed by W. Bulmer and Co. Cleveland-Row, St.
James’s; and Published (for the Proprietor) by Messr. Colnaghi and Co.Cokspur-Street, Charing-Cross, 1812.
Em 1840 é desenhado um mapa
que mostra o posicionamento das forças militares nas margens do Douro e as suas
movimentações em 12 de Maio de 1809.
fig. 10
- Col.t Sturgeon, Passage of the river Douro: on the 12 th. of May,1809; draw
on zinc by H.C. Maguire. 1840. Gravura p&b 46 x 32,5 cm. Em folha de 85 x
69 cm. Biblioteca Nacional. htp://purl.pt/29075
Do título do mapa consta,
ainda, a seguinte informação: "By
the British Army under the command of Liuet. General Sir A. Wellesley. K.B., in
face of the French Army commanded by Marshal Soult”.
fig. 11
– Pormenor da fig. Anterior.
Legenda:
A – Arrival of the Right
Column of the Army by the road from Coimbra.
B – Arrival of the Left Column
from the side of Aveiro.
C - Passage of the Douro by
the first Battalion of the E.G.L. under M. Gen.l John Murray at the
Ferry of Avintes.
D – Passage of the River by
the 3rd. Foot (Buffs) which was the the first battalion, that cross
near the Town of Oporto under Lieu.t Gen.l the Hon.ble
Edw.a Paget.
E – Building occupied by Lieu.t
Gen.l Paget to cover the Passage of the other troops.
F – Ferry were the remainder
of M. Gen.l Hill’s Brigade (the 3rd Foot being part of
that Brigade crossed the Douro under M. Gen.l Hill, and also a part
of B. Gen.l Richard Stewart’s Brigade.
G – Attack of the Enemy upon
the troops which first crossed the river under Lieu.t Gen.l
Paget.
H – Position of the French
Artillery.
K – Battery of two Brigades of
Artillery opened against the Right Flank of the Enemy’s Attack on General
Paget’s Right.
L – Advance of the Corps under
M. Gen.l John Murray.
M – Passage of the Troops
under M. Gen.l Sherbrooke in Boats brought from the opposite shore,
the Bridge having been burnt by the Enemy the night before.
N – Advance of the troops
under Lieu.t Gen.l Sherbrooke
O – Retreat of the Frnch.
P – Pursuit of the Enemy by
two Squadrons of the 10.rd British Cavalry, commanded by Major
Felton Hervey.
O Areinho no Cerco do Porto
Vinte e tal anos depois da
segunda Invasão Francesa, o lugar é de novo palco de acções militares durante o
Cerco do Porto na Guerra Civil.
Esta planta, a Carta
Topographica das Linhas do Porto, embora destinada a exemplificar as acções
militares na batalha do Cerco do Porto, mostra a situação da curva do rio e do
Areinho em 1834.
fig. 12
- Carta Topographica das Linhas do Porto. Levantada pelo coronel Moreira (Francisco
Pedro de Arbués Moreira 1777-1843), novamente lythographada. A. C. Lemos (? -
c. 1833/43), 1834.
fig. 13
– Pormenor da Carta Topographica das Linhas do Porto com os locais assinalados
a vermelho.
Na planta podemos ver sublinhadas a vermelho: a Bat.a do
Seminário, a Q.ta da China, a Q.ta do Freixo, e a
Bat.a da Pedra Salgada
No ano seguinte o Barão de
Forrester [22]
desenha uma litografia do lugar do Freixo ainda lembrando o Cerco do Porto,
colocando um soldado deitado sob um dos frondosos freixos.
fig. 14 - Joseph James Forrester
(1809-1861). J. J. Forrester, O Freixo perto ao Porto 1835. In O Artilheiro, de 4 de Março de 1836.
O passeio de Manoel Quentino de Uma Família Ingleza
E, para se ter uma ideia da
paisagem desta curva do rio e do Areinho nos meados do século XIX, socorremo-nos
de Júlio Diniz que em 1868, no romance Uma Família Ingleza, cria a
personagem de Manoel Quentino, um meticuloso e honesto guarda-livros, que ao
empreender um “passeio, com o fim de se distrahir, não hesitava na escolha
do itinerario. Desde tempos immemoriaes adoptára um e nem lhe passava por o
sentido modifical-o. Deixava-se conduzir por o habito n'isto, como em tudo o
mais. Atravessava a cidade até á Ribeira; seguia depois, pela margem direita
do rio, até Campanhã; chegando ao Esteiro, tomava pela estrada de cima, que o
levava ao jardim de S. Lazaro, e emfim recolhia-se a casa. [23]
Depois de chegar à Ribeira
onde descreve a chegada dos valboeiros ao cais e de fazer reflexões sobre a
pescada, descreve a Serra do Pilar “coroada
de ruínas do convento e da sua igreja circular”, vestígios ainda do
Cerco do Porto, onde se desenrolaram ferozes combates entre absolutistas e
liberais.
fig. 15
– Joaquim Cardoso Villanova (1793-1850), estampa 60
in Edifícios do Porto em
1833. Biblioteca Pública Municipal do Porto 1987.
James
Holland (1799-1870), desenha uma vista da do Porto com o Convento da Serra do
Pilar inserida no livro The tourist in
Portugal, de William Henry
Harrison, ainda com vestígios dessa batalha pela Serra do Pilar já que a
Serra do Pilar cuja bem domina
Ao Porto, se transforma em terrivel
Fortaleza… [24]
fig. 16
- James Holland (1799-1870), Vista do Porto tomada do Convento da Serra do
Pilar em Gaia.
In William Henry Harrison (1773-1841), The tourist in Portugal, Robert Jennings, 62 Cheapside London 1839.
In William Henry Harrison (1773-1841), The tourist in Portugal, Robert Jennings, 62 Cheapside London 1839.
fig. 17
- Joaquim Cardoso Villanova (1793-1850), Estampa 99
in Edifícios do Porto em 1833. Biblioteca Pública Municipal do Porto 1987.
in Edifícios do Porto em 1833. Biblioteca Pública Municipal do Porto 1987.
E este calótipo
de Frederick Flower, mostra dez anos depois, como seria a vista da Serra do
Pilar que a personagem de Júlio Diniz admirou.
fig. 18
- Frederick William Flower (1815-1889), Mosteiro da Serra do Pilar 1849/59.
Manoel Quentino detém-se por
momentos na Fonte do Carvalhinho para beber alguns goles da sua água “porque
tinha fé particular nas virtudes medicinaes d’aquella excelente água”, e
continua o seu passeio. [25]
J.
Bahia Júnior (?-?) na sua Dissertação Contribuição
para a Hygiene do Porto
de 1909
refere a Fonte do Carvalhinho como “situada
entre a ponte de D. Maria e a de D. Luiz, junto do portão da Fabrica de louça
do Carvalhinho.” E descreve a fonte acompanhada de uma fotografia. [26]
fig. 19
- J. Baía Fonte do
Carvalhinho 1909. Fig. n." 140 — Fonte do Carvalhinho. P., Porta
d'entrada para a mina que tem uma direcção perpendicular á entrada e parallela
ao frontispício da fonte. In J.
Bahia Júnior Contribuição para a Hygiene do Porto. Escola Medico-Cirurgica do
Porto. Porto 1909.
A Fonte do Carvalhinho ficava junto ao rio e à Quinta da Fraga, a qual foi adquirida pelos jesuítas que aí construíram uma capela do Senhor dos Carvalhinhos.
A Quinta da Fraga numa
fotografia de Frederick W. Flower.
fig. 20
- Frederick William Flower (1815-1889), Calçada da Corticeira e Quinta da
Fraga.
A quinta foi comprada em 1840 e
os novos proprietários aí instalaram em 1853, a Fábrica de Louça e Azulejo do Carvalhinho, que mais tarde (1923) se
deslocou para Gaia.
fig. 21
– Publicidade da Fábrica do Carvalhinho c.1910.
fig. 22
– Eduardo Coutinho, Fachada da frente do Projecto da Fábrica de cerâmica do
Carvalhinho em Vila Nova de Gaia 1922/23. Arquivo Municipal Sophia de Mello
Breyner, CMVNG
O lugar visto por Cesário Augusto Pinto
Em 1848, Cesário Augusto Pinto [27] publica um Álbum “As margens do Douro – coleção de doze vistas”, e onde apresenta três desenhos do lugar com a curva do rio e o Areinho.
fig. 23
- Cesário Augusto Pinto (1825-1895) Seminário in
As margens do Douro – coleção de doze vistas, 1848. Editada na litografia de
Joaquim Vitória Vilanova, com sede na Rua do Campo Pequeno, nº 1849, na cidade
do Porto. Biblioteca Pública Municipal de Gaia.
Neste primeiro desenho com o título “Seminário”, uma vista realizada ao
fim da tarde no Areinho, mostra na margem direita do Douro, a Quinta da China,
o Seminário em ruína e ao fundo entre as duas colinas, o pano ainda hoje
existente da muralha fernandina.
No Douro representado
demasiado estreito, navegam dois rabelos.
No primeiro plano, o Areinho
e, sob um freixo, um pescador de costas.
Mais adiante uma lavadeira com
a tradicional trouxa, e no extenso areal, um carro de bois que carrega uma
pipa.
Ainda na margem esquerda um
renque de choupos ou álamos que lembram o poeta: “álamos de las márgenes
del Duero, /conmigo vais, mi corazón os lleva!” [28]
Ao fundo o monte da Meijoeira
ou de S. Nicolau tendo por trás o antigo aqueduto que fornecia água ao mosteiro
da Serra do Pilar.
fig. 24
- Cesário Augusto Pinto (1825-1895) “Perspetiva do Seminário” in “As
margens do Douro – coleção de doze vistas”, 1848 foi editada na litografia de
Joaquim Vitória Vilanova, com sede na Rua do Campo Pequeno, nº 1849, na cidade
do Porto Biblioteca Pública Municipal de Gaia.
Neste segundo desenho “Perspetiva do Seminário”, uma ampla vista da
curva do rio ao cair da tarde, vemos à esquerda a margem norte do Douro com o
Seminário e mais adiante, junto à margem, a Quinta da China. Ao fundo o palácio
do Freixo, por trás do qual se ergue o Monte Crasto.
Na margem sul a zona do
Areinho, e o monte de Quebrantões.
Diz Júlio Dinis: “Os
olhos descobrem, de um lado, o extenso areal de Quebrantões, ao
qual succedem prados e leziras sempre verdes, veigas fertilissimas, arvoredos
espessos e, escondidas por o meio, as risonhas casas de algumas pequenas
povoações campestres; adiante as quintas da Pedra Salgada, e através do véo
azulado da distancia, a aprazivel aldeia de Avintes; do outro lado o palácio do
Freixo com seus torreões e balaustradas e as quintas e ribeiras de Valbom e Campanhã.
E se é ao fim do dia, quando o sol doura todo o quadro, reflectindo-se
afogueado nas vidraças voltadas ao occidente, e a viração da tarde enfuna as
velas brancas das pequenas embarcações do logar, e o céo é azul e as aguas
limpidas, a paizagem compensa bem os privados de gosar as bellezas mais
celebradas por viajantes e poetas, as analogas das quaes só a nossa cegueira
nos não deixa às vezes ver a dois passos da porta.” [29]
Finalmente uma vista com o título “A Pedra Salgada”, apresenta na margem esquerda do Douro o lugar da Pedra Salgada. Junto à Quinta da Torre Bela está representado um freixo (o Freixo?).
Finalmente uma vista com o título “A Pedra Salgada”, apresenta na margem esquerda do Douro o lugar da Pedra Salgada. Junto à Quinta da Torre Bela está representado um freixo (o Freixo?).
fig. 25
- Cesário Augusto Pinto (1825-1895) A Pedra Salgada in “As margens do Douro –
coleção de doze vistas”, 1848 foi editada na litografia de Joaquim Vitória
Vilanova, com sede na Rua do Campo Pequeno, nº 1849, na cidade do Porto
Biblioteca Pública Municipal de Gaia.
O lugar
no último quartel do século XIX
Na edição portuguesa do livro de Lady Jackson Fair Lusitania, traduzido e anotado por Camilo Castelo Branco e publicado em 1878, é inserida na página 300, uma gravura com o título de O Douro visto do antigo Seminário.
Na edição portuguesa do livro de Lady Jackson Fair Lusitania, traduzido e anotado por Camilo Castelo Branco e publicado em 1878, é inserida na página 300, uma gravura com o título de O Douro visto do antigo Seminário.
E na página 308 do mesmo livro
pode ler-se: “Graciosa paizagem, na verdade! Estendidos pelo fundo adeante,
ou trepando pelos montes arborisados que cingem este valle feliz, do lado
opposto, vèem-se jardins ao redor de pequenas cazas com telhados vermelhos,
prados, pomares de laranjeiras e limoeiros, campos de centeio e milho, vinhedos
e olivaes. No cimo, para completar o quadro, descobre-se a aldêa d'Avintes,
cujas cazas se apinham em volta da sua igreja entre o arvoredo.” [30]
fig. 26
- O Douro Visto do Antigo Seminario
in Lady Jackson (Catherine Hannah Charlotte Elliott) - Fair Lusitania [1874] – A Formosa Lusitânia, versão do inglez
prefaciada e anotada por Camillo Castello Branco. Livraria Portuense Editora,
121 Rua do Almada 123, Porto 1878.
Compare-se
com uma fotografia de autor não identificado (Flower?) tirada do mesmo local.
fig. 27
- Autor desconhecido. In
Monumentos Desaparecidos
A
mesma fotografia reproduzida no livro de Raquel Henriques da Silva sobre
Aurélia de Sousa.
fig. 28
– Autor desconhecido. In Raquel Henriques da Silva, Aurélia de Sousa,
Pintura Portuguesa do século XIX, Edições Inapa, S.A. 1992.
E num postal do início do século XX.
fig. 29
– Postal. Porto- Rio Douro.
O lugar
em 1892
Já nos finais do século XIX (1892), é publicada a magnífica "Carta Topográphica da Cidade do Porto", de Telles Ferreira que abrange a curva do rio, mesmo nos limites da Carta.
Já nos finais do século XIX (1892), é publicada a magnífica "Carta Topográphica da Cidade do Porto", de Telles Ferreira que abrange a curva do rio, mesmo nos limites da Carta.
Apesar das muitas intervenções
na marginal norte do Douro, de que se destaca a introdução do Caminho-de-Ferro,
com as alterações da paisagem provocadas pela Ponte D. Maria Pia e as fábricas
que então se vão instalando, ainda podemos perceber, quase na totalidade, o
percurso da personagem de Júlio Dinis.
fig. 30
- Pormenor da planta de Telles Ferreira 1892 com os lugares sublinhados a
vermelho.
Assim podemos ver
referenciadas e cartografadas: na margem direita junto ao rio e de jusante para
montante, o Monte do Seminario, a Quinta da China, o Rego
Lameiro, o Esteiro de Campanhã e a Quinta do Freixo. Na
margem sul, temos ao centro o Logar do Arieirinho [Areinho], à direita o
Logar de Beitões [Britões] e, na extrema-direita, o Logar das Pedras
Salgadas.
Correspondendo à Carta de
Telles Ferreira existe esta imagem, de F. Peixoto (?), que exibe uma
visão algo naïve, mas onde está retratada a curva do rio, lembrando o
texto de Eça de Queiroz e Ramalho Ortigão:
“…depois, de valle em valle, os lindos suburbios de Riba Douro: o choupal do Areinho, as espessas e murmurosas frescuras das quintas de Quebrantões, da Oliveira, da freguezia de Avintes; a bahia do Freixo, onde o rio tem a configuração de um pequeno lago circular dominado por um elegante palacio Luiz XV, de torreões e eirados senhoriaes, cuja elegante escadaria exterior mergulha venezianamente na agua.” [31]
“…depois, de valle em valle, os lindos suburbios de Riba Douro: o choupal do Areinho, as espessas e murmurosas frescuras das quintas de Quebrantões, da Oliveira, da freguezia de Avintes; a bahia do Freixo, onde o rio tem a configuração de um pequeno lago circular dominado por um elegante palacio Luiz XV, de torreões e eirados senhoriaes, cuja elegante escadaria exterior mergulha venezianamente na agua.” [31]
fig. 31
- F. Peixoto? Vista do Freixo a partir da Quinta da China. 57 x 77cm.189?
A luz é do meio dia. A vista é
tomada a partir da Quinta da China. Dois freixos, um de cada lado, enquadram a
paisagem lembrando o nome do lugar.
Do lado direito estende-se o
Areinho tendo ao fundo a Quinta da Alegria.
Do lado esquerdo o Lugar do
Freixo com a fábrica e o Palácio. Por trás a colina de Valbom, já povoada de
diversas casas. Ao fundo surge o monte Castro.
No Douro, onde navegam três lanchas de vela latina cheias de passeantes, um valboeiro à esquerda e ao fundo junto a uma embarcação, um rabelo que não possui mastro.
No Douro, onde navegam três lanchas de vela latina cheias de passeantes, um valboeiro à esquerda e ao fundo junto a uma embarcação, um rabelo que não possui mastro.
No centro uma imagem de uma
mulher - algo estática como se posasse para uma fotografia – parecendo uma
rapariga dos arredores do Porto, com o traje tradicional de vendedora de alhos,
calçando socos, vestida com uma camisa de mangas arregaçadas, um xaile amarelo
cruzado no peito, um avental laranja cobrindo a saia azul, um lenço branco na
cabeça e tendo nos
braços um cesto de alhos.
Ramalho Ortigão descreve essas
mulheres como “Mulheres bem-feitas, caminhando direitas, de cabeça
alta, cintura fina solidamente torneada sobre os rins, e alegres lenços
amarelos, de ramagens vermelhas, encruzados sobre a curva robusta do peito.
Canastras bem tecidas, grandes como berços, cobertas de pano de algodão em
listras azuis e encarnadas.” [32]
Um pouco mais adiante, no caminho de acesso à
Quinta da China um casal, do qual a uma feminina traja um vestido das últimas
décadas do século XIX, e o homem de costas parece manusear uma máquina
fotográfica.
Vários fotógrafos na época
produziam imagens sobre “Costumes do Porto” como a Casa E. Biel & C.ª de Emílio
Biel (1838-1915), [33] a Photografia
Guedes de Henrique António Guedes de Oliveira (1863-1932) ou a Casa Alvão de Domingos Alvão (1872-1946).
Muitas destas fotografias eram reproduzidas como postais ilustrados e baseadas
nas litografias de João Palhares (1819-1891). [34]
fig. 32
- Emílio Biel (1838-1915), Quebrantões. Album Phototypico de vistas e Costumes do
Norte de Portugal, 1899.
fig. 33
– Henrique António
Guedes de Oliveira (1863-1932), Mulher dos arredores do porto. Photo
Guedes.AHMP.
fig. 34
- João Palhares (18189-1891), Lavadeira,mulher dos arrabaldes da cidade do Porto.
Litho. Palhares T. da Palha 15.
Litho. Palhares T. da Palha 15.
In Costumes Portugueses, álbum de 60 litografias
aguareladas Lisboa c.1850.
Ou essas figuras com trajes
populares eram ainda tema de pintura como em Francisco José Resende.
fig. 35
– Francisco José Resende (1825-1893), Vendedora de flores 1879.
Óleo sobre madeira 33,5 x 25,5 cm. Col. particular.
Óleo sobre madeira 33,5 x 25,5 cm. Col. particular.
O Areinho de Marques de
Oliveira
Marques de Oliveira [35] vai pintar paisagens da sua cidade - o Porto – entre as quais as margens do rio Douro e o Areinho.
Como escreve o seu contemporâneo
Ribeiro Arthur, nestas pinturas de “róseas paisagens, tão
originaes, envolvidas n’uma bruma de sonho, cheias de um vago e indefinido
sentimento” Marques de Oliveira, “sabe aproveitar da natureza o
assumpto, sem d'ella tirar uma copia servil ; sabe imprimir aos seus
trabalhos o sentimento que manifesta a alma do artista e sem o qual a
pintura não seria superior a uma photographia colorida…” [36]
E em outro capítulo, citando
Fialho de Almeida:
“Ora o que me dizem dos quadros de Marques de Oliveira, da sensibilidade e cosmogonia psychica do paisagista? Cousas recônditas e finamente insólitas de emoção, harmonias de um symphonismo tão raro quanto inverosímil, apartes de interpretação pictural, emfim, que não existem fora do artista, mas que, observadas em globo, fazem da obra d’elle um verdadeiro tratado da alma cor de rosa na paisagem.” [37]
“Ora o que me dizem dos quadros de Marques de Oliveira, da sensibilidade e cosmogonia psychica do paisagista? Cousas recônditas e finamente insólitas de emoção, harmonias de um symphonismo tão raro quanto inverosímil, apartes de interpretação pictural, emfim, que não existem fora do artista, mas que, observadas em globo, fazem da obra d’elle um verdadeiro tratado da alma cor de rosa na paisagem.” [37]
fig. 36
- Marques de Oliveira (1853/1927), Areinho 1883.
Óleo sobre madeira 34,3 x 50,3 cm. Museu Nacional de Soares dos Reis Porto.
Óleo sobre madeira 34,3 x 50,3 cm. Museu Nacional de Soares dos Reis Porto.
Nesta pintura onde “…um pouco das sombras serenas /que as nuvens
transportam por cima do dia!” [38] e feita aparentemente a bordo de um barco no rio, o
Douro ocupa o primeiro plano da composição e a curva do rio Douro mal se
advinha.
Na parte superior um céu
carregado de nuvens.
No primeiro plano na margem de
uma pequena colina dois barcos transportam pessoas a bordo.
Adiante estende-se a praia do
Areinho, tendo por trás a outra margem onde se ergue o monte de Valbom.
Marques de Oliveira pinta uma
outra paisagem do Areinho, tendo por tema central os barcos.
fig. 37
- Marques de Oliveira (1853/1927), O Areinho – Porto 1883.
Óleo sobre madeira 32 cm x 46 cm. Museu de Grão Vasco Viseu.
Marques de Oliveira pinta “no
rio, ao pé dos choupos e dos freixos” [39] os barcos
utilizados para transporte de pessoas e de bens ou para a pesca, entre os quais
os característicos valboeiros.
O Areinho de Silva Porto
O Areinho de Silva Porto
O seu conterrâneo e companheiro Silva Porto [40] pintou o talvez mais conhecido dos quadros relacionado
com o Areinho.
fig. 38
- Silva Porto (1850 – 1893), No Areinho 1884.
Óleo sobre madeira
37,4 × 56 cm. Museu Nacional de Soares dos Reis.
Num enquadramento fotográfico
e sob um céu uniforme, uma figura feminina em traje de passeio negro e de
chapéu adornado (pensa-se ser Adelaide, a mulher do pintor), faz-se transportar
num destes barcos com toldo e sem vela, conduzido por uma barqueira, “remando
em pé com os seus longos remos, semelhantes aos das gôndolas venezianas, tão
pezados, tão difficeis de manobrar!” [41] na zona do
rio Douro.
O valboeiro de toldo em primeiro plano ocupa grande parte da composição. Ao fundo outros valboeiros atracados a varas espetadas no areal.
E sobre as barqueiras, no passeio de Manoel
Quentino aqui já referido, Júlio Dinis observa: “As barqueiras de Avintes
aproximavam os barcos da margem para os receber; outras, ainda a grande
distancia, chamavam, com toda a força d'aquelles pulmões robustos, as pessoas
que vinham por terra. Cruzavam-se os barcos, movidos pelos vigorosos braços
d'estas engraçadas e joviaes remeiras, e carregados com os frequentadores das
diversões campestres do Areinho e da pesca do savel. Tudo era riso e
cantigas no rio. Manoel Quentino via tudo isto, e escutava entretido o canto de
uma barqueira, que dizia:
As riquezas d'este mundo
Para mim não tem valor:
Eu sou rica nos tens braços,
Sou rica do teu amor.” [42]
As riquezas d'este mundo
Para mim não tem valor:
Eu sou rica nos tens braços,
Sou rica do teu amor.” [42]
E também Lady Jackson [43] observando a zona ribeirinha escreve: “Depois, a animação do Douro — grandes e pequenos navios á carga e descarga, um pequeno e elegante vapor de guerra, botes de formas variadas, o antigo barco, com as suas extremidades recurvas, o bote espaçoso construído á hollandeza com toldo, o pequeno e aceado cahique, e a gracioza vela latina passando e repassando. Todas estas embarcações navegam para baixo e para cima, a desembarcar passageiros ou a descarregar mercadorias. As mulheres também manejam o remo dextramente, e cantam emquanto vão remando. Tudo isto e muito mais se pode observar á medida que se caminha, mas o aspecto geral do primeiro lance de olhos é encantador.”
E mais adiante descrevendo
esta paisagem tendo por fundo Avintes: “Faz-se ali a broa ou pão de
milho, a maior parte do qual é consumido no Porto. Trazem-o para a cidade em
barcos, equipados por mulheres d'Avintes, que são consideradas as belles
par excellence, entre as formosíssimas d'esta parte de Portugal.” [44]
O Areinho de Aurélia de Souza
O Areinho de Aurélia de Souza
Manoel Quentino, a personagem de Júlio Dinis, prosseguindo o seu costumado passeio, “chegou á quinta chamada da China, — um dos passeios favoritos das classes populares portuenses. Desciam a rampa, que antecede o portão, alguns bandos de gente do povo, rindo, cantando, em plena festa; iam em direcção ao rio.” [45]
fig. 39
- Panorâmica sobre a Quinta da China e a zona do Areinho de Oliveira do Douro. AHMP.
Nesta Quinta chamada da China,
“com uma rasgada janella sobre o Douro” [46] viveu desde 1869, Aurélia de Souza [47], precisamente em face ao Areinho, onde pintou esta
curva do rio “em lonjuras de água, areal e linha azulada de colinas, sob
céus cinzentos.” [48]
fig. 40
- Teófilo Rego (1914 – 1993), Quinta da China, Campanhã, 1969, fotografia 9 x
12 cm.
Arquivo Histórico Municipal do Porto. AHMP.
E se muitos retrataram o sítio, Aurélia de Souza da sua varanda da Quinta da China, aberta ao Areinho e ao mundo, não só o pintou como intensamente o viveu, fazendo dele o lugar, o lugar habitado do seu quotidiano.
fig. 41
– Aurélia de Sousa, Vista do Douro, s/d, óleo s/tela 23 x 39,5 cm. Col.
Particular.
Na varanda sobre o Douro Aurélia de Sousa pinta, sob uma luz forte do fim de uma manhã solarenga, um vaso de gerânios,
“…three
geraniums outside a window,
trying to be
red and trying to be pink and
trying to be
fig. 42
- Aurélia de Souza (1866 -1921), Na
Varanda, s/d, s/a.
Através das grades da varanda, entrevê-se um tranquilo
Douro onde repousam dois barcos. Ao fundo o olhar abre-se para a paisagem da
margem do rio até Avintes.
Numa outra pintura Aurélia de Sousa, “os olhos pousados nas últimas rosas /dos grandes e calmos dias de setembro” [50], pintou um quadro do Areinho numa visão mais alegre e primaveril.
Numa outra pintura Aurélia de Sousa, “os olhos pousados nas últimas rosas /dos grandes e calmos dias de setembro” [50], pintou um quadro do Areinho numa visão mais alegre e primaveril.
fig. 43
- Aurélia de Souza (1866 -1921), Balaustrada da Quinta da China. s/d.
Óleo sobre
cartão - 37,4 x 57,8 cm. Casa Museu Marta Ortigão Sampaio Câmara Municipal do
Porto.
Sob
uma luz de final da manhã, na balaustrada da casa, que forma uma diagonal dando
algum dinamismo à composição, estão pousados vasos de rosas através dos quais
se vê o Areinho.
Ao fundo à esquerda, o lugar
do Freixo, onde se advinham o Palácio e as instalações fabris, tendo por detrás
o monte Castro.
Existem outras pinturas de
Aurélia de Sousa onde o Areinho é pintado a partir da sua casa na Quinta da
China, de uma forma mais realista e convencional.
fig. 44
- Aurélia de Souza, Vista do Douro, s/d Col. particular.
Duas extraordinárias pinturas de Aurélia de Sousa
Duas excepcionais paisagens do Areinho visto
da varanda da Quinta da China, melhor traduzem esse intenso amor de Aurélia
pelo (seu) lugar, e a modernidade da sua pintura pela forma como trata a curva do rio
Douro.
fig. 45
- Aurélia de Souza (1866 -1921), Margens do Douro 1903/07.
Óleo sobre
tela 66,5 x 80,5 cm. Fundação Casa de Bragança / Paço Ducal de Vila Viçosa.
Neste belo quadro, Margens
do Douro, pintado “quando a frágil alegria do olhar quebra na
sombra/o seu azul, o seu aroma” [51] Aurélia de
Sousa realiza uma composição em tons azulados e dourados, de um modo que,
segundo José Augusto França, lembra o impressionismo de Claude Monet [52] .
Aurélia de Sousa pinta o rio
com “…as neblinas do Douro esbatendo no vapor aquático, polvilhado de sol,
o risonho contorno do casario e das montanhas.” [53]
Numa outra excepcional pintura, que José Augusto França refere admitindo ser “inspirada pela arte de Turner [54] que a pintora vira em Londres”, a artista pinta uma visão surpreendentemente moderna, se a compararmos com a pintura portuguesa da época.
Numa outra excepcional pintura, que José Augusto França refere admitindo ser “inspirada pela arte de Turner [54] que a pintora vira em Londres”, a artista pinta uma visão surpreendentemente moderna, se a compararmos com a pintura portuguesa da época.
O quadro pintado em vibrantes
tons de azul e dourado, com uma matinal “luz acidulada a prumo,”
[55]
reflectindo-se num rio carregado de neblinas
e onde se advinham barcos.
O monte Castro ergue-se,
poderoso, ao fundo
“De onde é quase horizonte
Sobe uma névoa ligeira
e afaga o pequeno monte
que para na dianteira,… [56]
fig. 46
- Aurélia de Souza, Paisagem (Rio
Douro).
Óleo s/tela 44,5 x 53,5 cm., s/d, Coleção Fundação Casa de Bragança.
O Areinho e a industrialização
Entretanto a partir das primeiras décadas do século XX, os pintores do Porto
foram perdendo o interesse por estas paisagens românticas.
Apresenta-se apenas dois
quadros do Areinho. Um de Armando Basto [57] de 1917 e outro sem data, de Eduardo Viana. [58]
fig. 47
- Armando Basto (1889-1923), O Douro no Areinho 1917.
Óleo s/cartão 32.6 × 23.5
cm. Centro de Arte Moderna Fundação Calouste Gulbenkian.
Nesta composição de Armando Basto o lugar da curva do rio é tratado em largas manchas de cor, em que o contorno desaparece, provocando uma organização plástica do espaço.
No entanto podem ser
observadas a morfologia do local e referenciados os elementos que o constituem:
a Quinta da China à esquerda em primeiro plano, a mancha arenosa do Areinho com
a Quinta da Alegria, a margem direita do Douro onde se reconhece o lugar do
Freixo, a povoação de Valbom e, ao fundo, o Monte Castro.
fig. 48
- Eduardo Viana (1881-1967), óleo 26,5 x
35 cm. Col. particular.
O quadro de Eduardo Viana, “alaranjado pela primeira resplandecência do
sol-nascente” [59] destaca em primeiro plano junto à margem do Douro e pintadas
em tons vivos de amarelo, vermelho e laranja, duas casas e a fábrica
Carvalhinho com as suas altas chaminés que verticalizam o espaço e marcam a
escala da composição. (Ver a Fábrica do Carvalhinho no lado direito da figura
42)
O quadro destaca com esta
instalação fabril o avanço da industrialização sobre a bucólica paisagem de um tranquilo
rio Douro pintado em complementares tons de verde e azul e onde navegam tranquilos
dois barcos rabelos por entre aquelas superficiais neblinas que o frequentam.
Ao fundo ocupando a quase
totalidade da parte superior da composição o Areinho e a colina da curva do
rio.
O panorama desta curva do rio
é agora tema de postais e fotografias.
Um curioso postal “Recordação de Porto”, impresso em
Zurique, mostra o avanço da industrialização sobre o romântico lugar dessa
curva do Douro.
fig. 49
– Recordação do Porto. Ponte D. Maria Pia. Künzil fréres, Zurich.
Uma figura masculina em
primeiro plano enverga uma croça ou coroça (e não carniça), de
colete, chapéu e calçando tamancos, muito semelhante a um postal da época.
fig. 50
– Postal. Costumes Portuguezes. Maio.
A figura é retratada por José
Leite de Vasconcellos, na sua Etnografia Portuguesa.
fig. 51
– José Leite de Vasconcellos (1858-1941), Etnografia Portuguesa, Livro III.
Imprensa Nacional-Casa da Moeda. Lisboa. 1933-1988.
O
postal suíço apresenta, contudo, uma paisagem do Douro visto de Gaia, com o
caminho de ferro e a ponte D. Maria Pia e
no lado do Porto o Seminário.
Mas
mostra ainda junto ao Douro duas fábricas (Carvalhinho e Massarelos), com as
suas altas e fumegantes chaminés. Ao fundo a curva do rio.
A Fábrica do Carvalhinho com
as suas chaminés, à direita num postal do início do século XX.
fig. 52
– Postal. Vista da ponte D. Maria.
O Areinho e a construção da ponte D. Maria.
A construção da ponte Maria
Pia por Gustav Eiffell (1832-1923) e Théophile Seyrig (1843-1923), marca em
1877, a ligação do caminho de ferro entre o Norte e o Sul, entre as cidades do
Porto e de Lisboa.
E torna-se (com o Palácio de
Cristal e a ponte Luís I) um símbolo internacional do Porto como cidade moderna,
industrializada e que se queria como cidade do progresso.
Com a chegada do Caminho de Ferro às Devezas (Vila Nova de Gaia) em 1864, “Parece certo
abrir-se em breve o caminho-de-ferro até ao Porto: em tal caso, com permissão
de V. Ex.ª, ahi irei e o meu rapaz a pedirmos-lhe alguns dias de
hospitalidade.” [60], e com a
construção da linha do Norte, impunha-se o atravessamento do Douro por uma
ponte ferroviária.
Depois de um longo
processo de fixação do local desse atravessamento, em 1875 é aprovado pelo
Governo o caderno de encargos da construção da ponte, que permitiu lançar um
concurso internacional.
Ao concurso
apresentaram-se 4 empresas, tendo sido escolhida a empresa G. Eiffel et Compagnie cujo
projecto é aprovado pelo Governo em 1876.
A ponte foi inaugurada
em 4 de Novembro de 1877.
Em 1878 em “As Farpas” de Eça de Queiroz e Ramalho
Ortigão, a propósito da ausência da Câmara do Porto na inauguração da ponte D.
Maria, os autores descrevem o panorama da cidade visto do rio.
“…A cidade fronteira desdobrava aos nossos
olhos todos os seus encantos topographicos, desde a Foz, envolta na sua
athmosphera maritima, salgada e humida, até os montes longínquos do lado
opposto, levemente esfumados no horisonte sob as douradas pulverisações do sol.
Viamos a ridente collina de Villar coberta de verdura e coroada pelo Palacio de
cristal; os copados bosques do Candal e de Valle de Amores; o caes da Ribeira
com a sua arcaria denegrida e o seu pittoresco mercado de velhas barracas
alpendradas brunidas pelo sol; a ingreme
ladeira da Corticeira; o parque das Fontainhas; a casaria emassada das freguezias
da Sé e do Bomfim, com os seus predios esguios, terminando quase em pignon como na Hollanda: uns bem aprumados, tesos,
vidrosos, reluzentes, forrados de faiança, outros barrigudos, sombrios
enodoados, fazendo fincapé para não cambalearem como ebrios taciturnos; outros,
ainda, pintados de branco, pintados de azul, pintados de côr de rosa, com
chaminés bordadas e claras-boias phantasistas rematadas por trabalhosas
ventoinhas, jocundos, satisfeitos de si, rindo pelas sacadas abertas ornadas de
craveiros e de alecrins; depois, de valle em valle, os lindos suburbios de Riba Douro: o choupal do Areinho, as espessas e
murmurosas frescuras das quintas de Quebrantões, da Oliveira, da freguezia de
Avintes; a bahia do Freixo, onde o rio tem a configuração de um pequeno lago
circular dominado por um elegante palacio Luiz XV, de torreões e eirados
senhoriaes, cuja elegante escadaria exterior mergulha venezianamente na agua." [61]
E são estes autores que sublinham aquilo que a ponte representa como
progresso e o impacto democrático e moderno que tem na população do Porto:
“…A ponte sobre o
Douro symbolisa uma d'essas conquistas, uma d'essas victorias, um d'esses
triumphos: — a conquista de perto de meio seculo de paz; a victoria,
proporcional a esse periodo, da intelligencia do homem sobre as fatalidades da
natureza, o triumpho finalmente do destino progressivo do nosso espirito sobre
a immobilidade das nossas instituições.
Ha cerca de quarenta
annos apenas, ex.'ma camara, essas duas montanhas estreitamente enlaçadas agora
por um abraço de ferro, eram separadas por um rio vermelho de sangue. Nos
mesmos logares onde nós agora nos reunimos para regar o solo com o champagne das egapes modernas, os nossos
paes e os nossos avós espingardeavam-se convictamente, decidindo com o
sacrificio das suas vidas a questão de palacio a esse tempo debatida entre dois
principes.
A guerra com tal fundamento
seria hoje insustentavel. É evidente que progredimos, e o facto de irmos ao
Porto, desinteressadamente, aos milhares, celebrar um facto industrial,
significa a mais eloquente affirmação d'esse progresso.
A cidade do Porto que
por muitas vezes tem recebido a visita dos seus principes, dos seus reis, dos
seus generaes, dos seus mandões de toda a especie, teve pela primeira vez
n'esse dia a visita do povo…” [62]
fig. 53
– Joseph Legrand (?-?), Inauguração da ponte D. Maria Novembro de 1877.
A ponte Maria Pia é então
sobretudo retratada vista de poente, o que acentua o contraste entre a sua
filigrana de ferro com a paisagem bucólica e romântica do Areinho.
fig. 54
- Oporto-Puente de hierro denominado “Don Fernando”, sobre il Duero inaugurado
por S. M. El rey D. Luis I, el 4 del actual. – (De un dibujo remitido por D.
Laureano Fernandez) In La Ilustracion Española y Americana, Ano XXI, n.º XLIV de
30 Novembro de 1877. BNE.
E
num postal do início do século XX o túnel de acesso à ponte Maria Pia, onde
circula um comboio, tendo ao fundo o Areinho de Oliveira do Douro.
fig. 55
– Postal. Porto - Ponte D. Maria Pia.
E um outro postal mostrando o
mesmo panorama visto de uma cota superior.
fig. 56
– Postal. Porto – Ponte Maria Pia sobre o Rio Douro.
A ponte Maria Pia vista a partir do Areinho.
A ponte
ferroviária vista a partir do Areinho marca, para quem desce o rio, a entrada na cidade, a
passagem do mundo rural para o mundo urbano.
Na gravura publicada no jornal
O Occidente note-se os valboeiros
ancorados e as varas espetadas no areal para a amarração das embarcações.
fig. 57
– João Ribeiro Cristino da Silva (1858 - 1948)
desenhou e José Augusto de Oliveira gravou. Gravura, a partir de fotografia de
Emílio Biel, O Occidente n.º 419 de 11 de Agosto de 1890.
Semelhante ponto de vista é captado pela objectiva de Domingos Alvão.
fig. 58
– Domingos Alvão, Ponte de D. Maria. In Fotografia Alvão, Clichés do Porto
1902-2002. Ed. Fotografia Alvão 2002.
O Areinho local de recreio e de pesca
O Areinho era, na esquina dos
séculos XIX e XX, um local privilegiado para embarque em passeios no rio e para
desportos náuticos.
O postal da Estrela Vermelha
de cerca de 1905, intitulado Regata no
rio Douro, mostra uma razoável quantidade de barcos navegando no rio, um
dos quais é já a vapor.
Ao fundo na margem direita, rodeando
o Palácio do Freixo, as fábricas de Cerâmica de Massarelos, Harmonia e de
Sabões com as suas chaminés.
E para além dos passeios e das
regatas o local era ainda ponto de partida para a pesca do sável. Note-se as
chaminés e as fábricas ao longo da margem direita.
fig. 61
– Postal. Costumes Portuguezes – Porto –
Areinho – Pesca do Savel. AHMP.
fig. 62
– Postal. Porto - Ponte D. Maria Pia.
Arnaldo Soares
fig. 63
- Postal. Pesca do Sabel. Areinho. Repositório
Temático da Universidade do Porto. (modificado).
Três momentos da paisagem
fig. 64
– Postal. Porto- Ponte Maria Pia e
Areinho. Postal colorido c.1900.
Editor: Alberto Ferreira Impressor: [Papelaria
e Tipografia Académica], AHMP.
Um postal de meados do século XX.
fig. 65
– A ponte Maria Pia no início dos anos 70 do século XX.
O lugar na actualidade.
fig. 66
- Fotografia actual. C. M. de Vila Nova de Gaia.
Por isso, podemos hoje dizer com Pablo Neruda que:
Y pasa el río
bajo los nuevos puentes
cantando con la historia
palabras puras
que llenarán la tierra. [63]
Anexo.
O texto de Júlio Dinis em Uma
Família Ingleza
(...) Sempre
que Manoel Quentino emprehendia um passeio, com o fim de se distrahir, não
hesitava na escolha do itinerario. Desde tempos immemoriaes adoptára um e nem
lhe passava por o sentido modifical-o. Deixava-se conduzir por o habito n'isto,
como em tudo o mais. Atravessava a cidade até á Ribeira; seguia depois, pela
margem direita do rio, até Campanhã; chegando ao Esteiro, tomava pela estrada
de cima, que o levava ao jardim de S. Lazaro, e emfim recolhia-se a casa. Foi o
que fez n'aquella tarde. A cidade atravessou-a lidando ainda com o pensamento
de tristeza, com que saíra de casa. A primeira diversão operou-a só a vista do
mercado de peixe, na Ribeira. As lanchas valboeiras tinham, n'aquelle instante,
chegado ao caes. As regateiras, os compradores particulares e os pescadores que
vendiam, animavam o mercado com movimento e vozeria. Este espectaculo, cheio de
vida commercial, não achou indifferente Manoel Quentino. Agradava-lhe aquelle
trafego; examinava com olhos conhecedores a excellencia do peixe, e
informava-se curioso dos preços que regulavam o mercado. Ao saír d'alli, ia
pensando: —Não ha nada para arranjo domestico, como a pescada. É o peixe mais
innocente que ha. Com razão lhe chamam a gallínha do mar. Ahi está a sardinha,
que é gostosa; mas é mais doentia tambem. Que a sardinha de Espinho ainda não
tanto, mas esta da barra!… D'onde virá a differença?… Pois não será toda ella o
mesmo peixe?… Só se é da praia aqui ser mais pedregosa e o peixe saír mais
batido… Que esta costa da Foz sempre é muito cheia de pedras!… Só o perigo que
correm as embarcações aqui!… Ainda no outro dia, aquella grande desgraça dos
oito pescadores que naufragaram!… Muita pena teve Cecilia, quando as folhas
contaram de um que deixou uma creancinha orphã! Pobre Cecilia!… tem um
coração!… Coitada!… É um anjo… Assim que me lembro d'aquella tristeza em que
anda… E ahi estava a ideia fixa com elle! Parece que ella propria fora a que
dispozera esta fileira de ideias associadas, para conduzir a si o pensamento.
A impressão produzida pelo mercado desvanecera-se de todo; Manoel Quentino proseguiu no passeio, já outra vez melancolico. Mais adiante, tendo passado a ultima casa, que lhe tolhia a vista do rio e a da margem opposta, volveu naturalmente os olhos para o vulto escalvado e sombrio da Serra do Pilar, coroada pelo seu convento em ruinas e a sua igreja circular. Os tristes vestigios das guerras civis estão ainda n'aquelle logar muito evidentes, para que a lembrança d'ellas não acuda subita ao espirito de quem quer que o contemple por momentos. Manoel Quentino, como quasi todos os portuenses da sua idade, havia sido mais do que simples espectador das scenas tragicas d'essas memoraveis épocas. —Ha vinte e tantos annos—pensava elle—não havia, a estas horas, tanto socego, por aquelles sitios, não. Nem tambem estes passeios pela beira do rio eram tanto de appetecer como agora. Havia mais perigos, do que o dos nevoeiros do Douro. A fallar a verdade sempre era um tempo aquelle!… O que eu passei!… Parece-me que ainda foi o outro dia, e já lá vão vinte e tantos annos!… Oh! mas que alegria tambem, quando se abriram as linhas!… N'esse tempo era ainda a mãe de Cecilia uma creança. Só quatro annos depois é que eu principiei a pensar n'ella … Pobre rapariga! … Parece-me que ainda a estou a ver! … delgadinha, desmaiada, boa para todos, mas trabalhadeira ao mesmo tempo … É por isso que receio… Valha-me Deus! assim que me lembro da tristeza da pequena!… E da Serra do Pilar e do tempo do Cerco conseguira aquella ideia dominante achar caminho para se lhe insinuar de novo no pensamento. E, o que mais é, parece que cada vez trazia comsigo maior cortejo de sinistros pressagios.
Ao chegar á fonte do Carvalhinho, subiu uns degraus de pedra que alli ha, e bebeu, mesmo do caneiro, alguns goles de agua; cousa que nunca se esquecia de fazer, porque tinha fé particular nas virtudes medicinaes d'aquella excellente agua.
— Ah! — dizia elle outra vez distrahido — Consola beber uma agua assim! Para aguas o Porto! Dizem que em Lisboa são más as aguas! Pois é das cousas mais precisas para a saude. É verdade que eu vejo por aqui tambem muitas doenças, apesar das aguas boas. E sobretudo a gente nova está saíndo tão franzina e tão fraca, que é uma cousa por maior! E o medo, que eu tenho, quando reparo em Cecilia! É tão delicada, tão… E ahi estava outra vez assombrado para grande espaço de tempo.
Chegou á quinta chamada da China,—um dos passeios favoritos das classes populares portuenses. Desciam a rampa, que antecede o portão, alguns bandos de gente do povo, rindo, cantando, em plena festa; iam em direcção ao rio. As barqueiras de Avintes aproximavam os barcos da margem para os receber; outras, ainda a grande distancia, chamavam, com toda a força d'aquelles pulmões robustos, as pessoas que vinham por terra. Cruzavam-se os barcos, movidos pelos vigorosos braços d'estas engraçadas e joviaes remeiras, e carregados com os frequentadores das diversões campestres do Areinho e da pesca do savel. Tudo era riso e cantigas no rio. Manoel Quentino via tudo isto, e escutava entretido o canto de uma barqueira, que dizia:
As riquezas d'este mundo
Para mim não tem valor:
Eu sou rica nos tens braços,
Sou rica do teu amor.
E elle pôz-se a pensar: —Como esta pobre gente vive satisfeita n'esta vida trabalhosa do rio!… Ao vento, á chuva, e sabe Deus o que tem em casa para comer! E é um gosto como ellas cantam e riem!… Raparigas de quinze e dezeseis annos consola vel-as já mover aquelles remos, que esfalfariam um homem, como eu. Não ha como estes ares e esta vida do campo, para fazer as pessoas robustas. Se eu adivinhasse que Cecilia aproveitaria com elles!… E retomava o pensamento a posição de equilibrio estavel, de que por instantes se desviára.
Chegou ao ponto da margem, chamado Rego Lameiro. Ahi opéra o Douro uma das suas subitas e surprendentes transformações. Expiram as collinas fronteiras de uma e outra margem, interrompidas por um valle deliciosissimo, onde a vegetação é mais abundante, mais povoadas as verduras, e onde se encorporam em riachos as aguas escoadas dos proximos declives. Apreciam-se tão raros intervallos, em que o Douro, o severo Douro, sorri, como se aprecia um raio de alegria em rosto habitualmente carregado.
N'este sitio alarga-se o leito das aguas, diminue portanto a força da corrente d'ellas, chegando, nas marés baixas, a permittir a formação de pequenos ilhotes de areia, para onde vão brincar as creanças dos pescadores. A tortuosidade das margens, furtando á vista o seguimento do rio, dá a este a completa apparencia de um pequeno, mas pittoresco lago. Os olhos descobrem, de um lado, o extenso areal de Quebrantões, ao qual succedem prados e leziras sempre verdes, veigas fertilissimas, arvoredos espessos e, escondidas por o meio, as risonhas casas de algumas pequenas povoações campestres; adiante as quintas da Pedra Salgada, e através do véo azulado da distancia, a aprazivel aldeia de Avintes; do outro lado o palácio do Freixo com seus torreões e balaustradas e as quintas e ribeiras de Valbom e Campanhã. E se é ao fim do dia, quando o sol doura todo o quadro, reflectindo-se afogueado nas vidraças voltadas ao occidente, e a viração da tarde enfua as velas brancas das pequenas embarcações do logar, e o céo é azul e as aguas limpidas, a paizagem compensa bem os privados de gosar as bellezas mais celebradas por viajantes e poetas, as analogas das quaes só a nossa cegueira nos não deixa ás vezes ver a dois passos da porta.
Era aqui que Manoel Quentino se sentava sempre durante alguns minutos, sobre uma pedra solta da margem.
—Como isto é bonito!—pensava elle—É que nem ha outro passeio assim, nos arredores do Porto. E a tarde então está tão serena e socegada, que até se percebe d'aqui tudo o que se diz no Areinho. Se eu tivesse dinheiro, era onde comprava uma quinta. Chegando aos sabbados, saía do escriptorio e mettia-me n'um barco… ou a pé mesmo… A final é um passeio… É verdade que se viesse Cecilia, sempre era longe. Ainda que ella não se cansa… Não se cansa?… não se cansava… agora…
E a ideia negra, aquella pertinaz ideia negra, a tomar outra vez posse de Manoel Quentino! e, com o ir adiantando-se a tarde, parecia cada vez mais negra, como se as sombras crescessem para ella tambem!
D'ahi em diante, não se modificou o processo das cogitações do velho.
Uma fabrica de cortumes, umas creanças, a quem deu esmola, uns armazens, tudo quanto viu, após varias oscillações do pensamento, faziam caír Manoel Quentino na preoccupacão anterior.
De maneira que o passeio, aquelle passeio que o devia distrahir, antes lhe exacerbou o mal, que o atribulava. Subia elle já a íngreme costeira, que leva do Esteiro de Campanhã até o sitio do Padrão. A tarde arrefecera subitamente. (...)
A impressão produzida pelo mercado desvanecera-se de todo; Manoel Quentino proseguiu no passeio, já outra vez melancolico. Mais adiante, tendo passado a ultima casa, que lhe tolhia a vista do rio e a da margem opposta, volveu naturalmente os olhos para o vulto escalvado e sombrio da Serra do Pilar, coroada pelo seu convento em ruinas e a sua igreja circular. Os tristes vestigios das guerras civis estão ainda n'aquelle logar muito evidentes, para que a lembrança d'ellas não acuda subita ao espirito de quem quer que o contemple por momentos. Manoel Quentino, como quasi todos os portuenses da sua idade, havia sido mais do que simples espectador das scenas tragicas d'essas memoraveis épocas. —Ha vinte e tantos annos—pensava elle—não havia, a estas horas, tanto socego, por aquelles sitios, não. Nem tambem estes passeios pela beira do rio eram tanto de appetecer como agora. Havia mais perigos, do que o dos nevoeiros do Douro. A fallar a verdade sempre era um tempo aquelle!… O que eu passei!… Parece-me que ainda foi o outro dia, e já lá vão vinte e tantos annos!… Oh! mas que alegria tambem, quando se abriram as linhas!… N'esse tempo era ainda a mãe de Cecilia uma creança. Só quatro annos depois é que eu principiei a pensar n'ella … Pobre rapariga! … Parece-me que ainda a estou a ver! … delgadinha, desmaiada, boa para todos, mas trabalhadeira ao mesmo tempo … É por isso que receio… Valha-me Deus! assim que me lembro da tristeza da pequena!… E da Serra do Pilar e do tempo do Cerco conseguira aquella ideia dominante achar caminho para se lhe insinuar de novo no pensamento. E, o que mais é, parece que cada vez trazia comsigo maior cortejo de sinistros pressagios.
Ao chegar á fonte do Carvalhinho, subiu uns degraus de pedra que alli ha, e bebeu, mesmo do caneiro, alguns goles de agua; cousa que nunca se esquecia de fazer, porque tinha fé particular nas virtudes medicinaes d'aquella excellente agua.
— Ah! — dizia elle outra vez distrahido — Consola beber uma agua assim! Para aguas o Porto! Dizem que em Lisboa são más as aguas! Pois é das cousas mais precisas para a saude. É verdade que eu vejo por aqui tambem muitas doenças, apesar das aguas boas. E sobretudo a gente nova está saíndo tão franzina e tão fraca, que é uma cousa por maior! E o medo, que eu tenho, quando reparo em Cecilia! É tão delicada, tão… E ahi estava outra vez assombrado para grande espaço de tempo.
Chegou á quinta chamada da China,—um dos passeios favoritos das classes populares portuenses. Desciam a rampa, que antecede o portão, alguns bandos de gente do povo, rindo, cantando, em plena festa; iam em direcção ao rio. As barqueiras de Avintes aproximavam os barcos da margem para os receber; outras, ainda a grande distancia, chamavam, com toda a força d'aquelles pulmões robustos, as pessoas que vinham por terra. Cruzavam-se os barcos, movidos pelos vigorosos braços d'estas engraçadas e joviaes remeiras, e carregados com os frequentadores das diversões campestres do Areinho e da pesca do savel. Tudo era riso e cantigas no rio. Manoel Quentino via tudo isto, e escutava entretido o canto de uma barqueira, que dizia:
As riquezas d'este mundo
Para mim não tem valor:
Eu sou rica nos tens braços,
Sou rica do teu amor.
E elle pôz-se a pensar: —Como esta pobre gente vive satisfeita n'esta vida trabalhosa do rio!… Ao vento, á chuva, e sabe Deus o que tem em casa para comer! E é um gosto como ellas cantam e riem!… Raparigas de quinze e dezeseis annos consola vel-as já mover aquelles remos, que esfalfariam um homem, como eu. Não ha como estes ares e esta vida do campo, para fazer as pessoas robustas. Se eu adivinhasse que Cecilia aproveitaria com elles!… E retomava o pensamento a posição de equilibrio estavel, de que por instantes se desviára.
Chegou ao ponto da margem, chamado Rego Lameiro. Ahi opéra o Douro uma das suas subitas e surprendentes transformações. Expiram as collinas fronteiras de uma e outra margem, interrompidas por um valle deliciosissimo, onde a vegetação é mais abundante, mais povoadas as verduras, e onde se encorporam em riachos as aguas escoadas dos proximos declives. Apreciam-se tão raros intervallos, em que o Douro, o severo Douro, sorri, como se aprecia um raio de alegria em rosto habitualmente carregado.
N'este sitio alarga-se o leito das aguas, diminue portanto a força da corrente d'ellas, chegando, nas marés baixas, a permittir a formação de pequenos ilhotes de areia, para onde vão brincar as creanças dos pescadores. A tortuosidade das margens, furtando á vista o seguimento do rio, dá a este a completa apparencia de um pequeno, mas pittoresco lago. Os olhos descobrem, de um lado, o extenso areal de Quebrantões, ao qual succedem prados e leziras sempre verdes, veigas fertilissimas, arvoredos espessos e, escondidas por o meio, as risonhas casas de algumas pequenas povoações campestres; adiante as quintas da Pedra Salgada, e através do véo azulado da distancia, a aprazivel aldeia de Avintes; do outro lado o palácio do Freixo com seus torreões e balaustradas e as quintas e ribeiras de Valbom e Campanhã. E se é ao fim do dia, quando o sol doura todo o quadro, reflectindo-se afogueado nas vidraças voltadas ao occidente, e a viração da tarde enfua as velas brancas das pequenas embarcações do logar, e o céo é azul e as aguas limpidas, a paizagem compensa bem os privados de gosar as bellezas mais celebradas por viajantes e poetas, as analogas das quaes só a nossa cegueira nos não deixa ás vezes ver a dois passos da porta.
Era aqui que Manoel Quentino se sentava sempre durante alguns minutos, sobre uma pedra solta da margem.
—Como isto é bonito!—pensava elle—É que nem ha outro passeio assim, nos arredores do Porto. E a tarde então está tão serena e socegada, que até se percebe d'aqui tudo o que se diz no Areinho. Se eu tivesse dinheiro, era onde comprava uma quinta. Chegando aos sabbados, saía do escriptorio e mettia-me n'um barco… ou a pé mesmo… A final é um passeio… É verdade que se viesse Cecilia, sempre era longe. Ainda que ella não se cansa… Não se cansa?… não se cansava… agora…
E a ideia negra, aquella pertinaz ideia negra, a tomar outra vez posse de Manoel Quentino! e, com o ir adiantando-se a tarde, parecia cada vez mais negra, como se as sombras crescessem para ella tambem!
D'ahi em diante, não se modificou o processo das cogitações do velho.
Uma fabrica de cortumes, umas creanças, a quem deu esmola, uns armazens, tudo quanto viu, após varias oscillações do pensamento, faziam caír Manoel Quentino na preoccupacão anterior.
De maneira que o passeio, aquelle passeio que o devia distrahir, antes lhe exacerbou o mal, que o atribulava. Subia elle já a íngreme costeira, que leva do Esteiro de Campanhã até o sitio do Padrão. A tarde arrefecera subitamente. (...)
Júlio
Diniz (Joaquim Guilherme Gomes Coelho (1839-1871), Uma Família Ingleza, Scenas
da Vida do Porto, Terceira edição Porto, Em casa de A. R. da Cruz Coutinho,
Editor 18—Rua dos Caldeireiros—20, 1875. (páginas 201 a 205)
[1] Jorge Luis Borges (1899-1986) arte poética
in el hacedor 1960, Alianza Editorial Madrid 2003. Tradução: Olhar o
rio feito de tempo e água / E recordar que o tempo é outro rio. / Saber que nos
perdemos como o rio / E que os rostos passam como a água.
[2] Visconde de Villa Maior (Júlio Máximo de Oliveira
Pimentel 18091884),
O Douro Illustrado, album do Rio Douro e paiz
vinhateiro.
Livraria
Universal Magalhães & Moniz – Editores Largo dos Loyos, 12 a 14, Porto
1876. (pág.156).
[3] Antonio Machado (Antonio Cipriano José María y
Francisco de Santa Ana Machado Ruiz, 1875-1939) IX Orillas del Duero in Soledades,
Galerías y Otros Poemas, 1907, segunda edicion, Coleccion Universal
Madrid-Barcelona, MCMXIX. (pág. 18). Tradução: O Douro corre, suave e mudo,
mansamente.
[4] António Cabral (1931-2007), Ode ao Rio Douro in Poemas Durienses, Opera Omnia,Guimarães 2017. (pág.17).
[5] Fernando Pessoa (1888-1935), Cancioneiro [160]
11-9-1933, in Fernando
Pessoa, Obra Poética, Volume Único. Companhia Aguilar Editora, 2.ª edição. Rio
de Janeiro 1965. (pág. 171)
[6] Aluno da Escola de Belas Artes de Lisboa e das
Escola Industriais do Príncipe Real, Rodrigues Sampaio e Machado de Castro,
estudou modelo vivo no Grémio Artístico e na Sociedade Nacional de Belas Artes.
Em 1897 foi admitido no atelier de desenho industrial
que Roque Gameiro dirigia na Companhia Nacional Editora. Deixou o atelier em
1903 e entrou para a Ilustração Portuguesa, a revista semanal do jornal
diário de Lisboa O Século, a convite do seu director, Silva Graça. Pouco
tempo ficou na revista, passando a ilustrar para publicações como os jornais Mundo,
Novidades, A Capital, República, entre outras. Colaborou
também para publicações estrangeiras como o L'Illustration e o Illustrated
London News.
Aguarelista expôs pela primeira vez em 1901, no Grémio
Artístico. Em 1911 concorreu a uma exposição realizada em Madrid e em 1913 teve
a sua primeira exposição individual, na redacção de A Capital, passando
no começo dos anos 20 a expor regularmente.
Em 1914 foi nomeado conservador artístico na Inspecção
das Bibliotecas e Arquivos Nacionais.
Em 1931 participou na Exposição Colonial de Paris com
um conjunto de aguarelas dos monumentos portugueses em Marrocos. Dedicou-se
também à ilustração de livros, tendo organizado muitas das obras da Enciclopédia
pela Imagem.
[7]
Maria Angelina e Raúl Brandão (1867-1930), Portugal
pequenino, 1929. edição Seara Nova 1930. Edição ilustrada por Carlos
Carneiro (1900-1971) e José Tagarro (1901- 1931). Nova edição Portugal
Pequenino. Coimbra: Atlântida, 1970.
[8] Armando Matos, o Barco rabelo, ed. da Junta Provincial de
Etnografia e História do Douro Litoral, Porto 1940. (pág.66).
[9] Armando Matos, o Barco rabelo, ed. da Junta Provincial de
Etnografia e História do Douro Litoral, Porto 1940. (pág.59).
[10] Júlio Diniz (Joaquim Guilherme Gomes Coelho
(1839-1871), Uma Família Ingleza, Scenas da Vida do Porto, Terceira
edição Porto, Em casa de A. R. da Cruz Coutinho, Editor 18—Rua dos
Caldeireiros—20, 1875. (pág.204).
[12] Firmino Pereira, O Porto de Outros Tempos,
Notas Históricas- Memórias-Recordações, Livraria Chardron de Lello & Irmão,
Rua das Carmelitas 144, Porto 1914. (pág.297).
[13] Jean
Pillement (1728-1808). Inicia-se como pintor em Lyon. Parte para Paris onde
trabalha nas Manufacturas dos Gobelins. Em 1745 vem pela 1ª vez a Portugal.
Depois viaja por Inglaterra, Itália, Áustria e Polónia onde em 1776 se torna
pintor real. Torna-se em 1778 o pintor de Maria Antonieta executando as
pinturas do Petit Trianon. Em 1780 regressa a Portugal e instala-se no Porto na
Porta do Olival. Cyrillo Wolkmar Machado (1748-1823) escreve: “Costumou-se a
viajar, e esteve três vezes em Lisboa: a 1ª antes do terremoto de 55, a 2.ª
pelos annos 1766, e a ultima 14 annos depois. Desta ultima vez demorou-se, e
fez muitos, e bellos paizes, huns a pastel, (género em que se excedia), outros
a óleo, e todos se acháo pelos gabinetes dos curiosos. In Colecção de
Memórias Relativas às vidas dos pintores e escultores. Architectos, e
gravadores portuguezes, e dos estrangeiros, que estiverão em Portugal. Recolhidas e ordenadas por Cyrillo Wolkmar Machado seguidas de notas
pelos Dr. J. M. Teixeira de Carvalho e Dr. Vergílio Correia. Coimbra.1922.
(pág. 168 e 169).
[14] Sophia
de Mello Breyner Andresen (1919-2004), poema Barcos em Coral (1950) in
Obra Poética. Assírio & Alvim Porto Editora 2015. (pág.278).
[15] Almeida
Garrett (1799-1854), A Sesta, in
Versos de Almeida Garrett I. Lyrica. Nova edição Em casa da Viúva Bertrand e
Filhos, Lisboa 1853. (pág.55)
[16] Alberto
(Augusto de Almeida) Pimentel (1849- 1925), Espelho
de Portugueses, Vol. I. Parceria António Maria Pereira, Rua Augusta
50,52,54. Lisboa 1901. (pág. 137).
[18] António Joaquim de Mesquita e Mello (1792-1884),
O Porto invadido e Libertado 1815 Canto II in Poesias,
Reimpressas e Ineditas de Antonio Joaquim de Mesquita e Mello, Tomo I Porto, na
Typographia de Sebastião José Pereira, Praça de Santa Thereza, 28 a 30, 1860.
(pág. 54 e 55).
[19] Henri L’Eveque (1769-1832). Pintor suíço que
viveu alguns anos em Portugal e Espanha. Entre 1812 e 1823 instalou-se em
Londres. Regressou a Genebra depois de uma passagem por Roma.
[20] General
Sir John Murray (c.1768-1827). Durante a Segunda Invasão Francesa comandou a 7ª
Brigada a maior do exército de Arthur Wellesley (1769- 1852), o futuro 1º Duque
de Wellington.
[21] General
Sir Edward Paget (1775-1849), comandou o ataque às forças francesas instaladas
no Porto.
[23] Júlio
Diniz (Joaquim Guilherme Gomes Coelho (1839-1871), Uma Família Ingleza, Scenas da Vida do Porto, Terceira edição
Porto, Em casa de A. R. da Cruz Coutinho, Editor 18—Rua dos Caldeireiros—20,
1875. (páginas
201 a 205).
[24] José
Martins Rua. Pedreida Poema Heroico da
Liberdade Portuense. Typographia Commercial Portuense, Rua de Bello-Monte
n.º 55 Porto 1843. (pág.124).
[25] Idem.
[26] J. Bahia Júnior, Contribuição
para a Hygiene do Porto. Dissertação apresentada na Escola Medico-Cirurgica
do Porto. Porto 1909. (pág.79).
[27] Cesário Augusto Pinto de Araújo Cardoso de
Mendonça (1825-1895). Nasceu em Lisboa mas cedo rumou a Bruxelas onde
frequentou o Instituto Gaggia-Vermehr e concluiu o seu curso em 1843. Aí chegou
a leccionar mas em 1846 regressou a Portugal. Em 1849, no Porto, serviu como
intérprete do rei de Piemonte, Carlos Alberto. Em 1855 colaborou com o
engenheiro Cousin nos estudos da linha do caminho-de-ferro de Lisboa a Sintra.
Em 1856 trabalhou na construção da Vila Estefânia e na construção do caminho da
madeira do Pinhal de Leiria. Em 1860 projetou e dirigiu, ao serviço da
Companhia de Viação Portuense, o troço de estrada do Porto a Braga que incluía
a construção da ponte pênsil da Trofa. Findos estes trabalhos, partiu para
Angola onde desenvolveu alguns trabalhos de engenharia. Dessa estadia em África
deixou-nos o respetivo relato no livro intitulado “Quarenta e cinco dias em
Angola”, publicado no Porto em 1862. Em 1870 serviu como agrimensor e
engenheiro municipal na Câmara de Guimarães. Dirigiu também as obras do porto
de Viana do castelo e de reparação do convento de S. Domingos daquela cidade.
Foi autor do projeto do edifício das termas de Vizela e administrador das
respetivas obras, autoria que lhe valeu, em 1875, um prémio da Associação de
Arquitetos Civis. Cesário Augusto Pinto faleceu em Guimarães, na sua casa sita
à Rua de Camões, nº 96, com a idade de 70 anos, tendo sido sepultado no
cemitério de S. João das Caldas de Vizela. Fonte: Memórias Gaienses, Sala
Armando Matos, Biblioteca Pública Municipal. Vila Nova de Gaia. http://memoriasgaiensesbibliotecadegaia.blogspot.pt/2014/03/a-melhor-colecao-oitocentista-de-vistas_20.html
[28] Antonio Machado (1875-1939) A Orillas del
Duero VIII in Campos de Castilla, Madrid, Renacimiento,
Sociedade Anonima Editorial, Pontejos, 8. 1912. (pág. 63). Tradução: álamos
das margens do Douro, / comigo ides, o meu coração vos leva!
[29] Júlio Diniz (Joaquim Guilherme Gomes Coelho
(1839-1871), Uma Família Ingleza, Scenas da Vida do Porto, Terceira
edição Porto, Em casa de A. R. da Cruz Coutinho, Editor 18—Rua dos
Caldeireiros—20, 1875. (páginas 201 a 205).
[30] Lady Jackson (Catherine Hannah Charlotte
Elliott) - Fair Lusitania [1874] – A Formosa Lusitânia, versão do inglez
prefaciada e anotada por Camillo Castello Branco Livraria Portuense Editora 121
Rua do Almada 123, Porto 1878. (pág. 300 e 308).
[31] Eça de Queiroz e Ramalho Ortigão - “À Ex.ª
Camara Municipal do Porto ou a quem suas vezes fizer” in As Farpas - III
série - Tomo I - Janeiro 1878 – Typographia Universal – Lisboa 1878.
[32] (José
Duarte) Ramalho Ortigão (1836-1915), O Porto Julho de 1883 in As Farpas
I décimo Volume pag.86 Círculo dos Leitores 1988. (pág.88).
[34] João Palhares (18189-1891), Costumes Portugueses,
álbum de 60 litografias aguareladas Lisboa c.1850.
[35] Marques de Oliveira (João Joaquim Marques da
Silva Oliveira 1853-1927) frequentou a Academia Portuense de Belas Artes. Entre
1866 e 1869 expôs os primeiros trabalhos na 9ª e 10ª Exposição Trienal da
Academia Portuense de Belas Artes. Em 1873, parte para Paris onde frequenta a
Escola de Belas Artes e contacta com o naturalismo da Escola de Barbizon. De
regresso passa a expor regularmente nas exposições do Centro Artístico
Portuense e da Academia de Belas-Artes do Porto e exporá em Lisboa na Sociedade
Promotora e no Grémio Artístico e a partir do início do século XX na
Sociedade Nacional de Belas-Artes. Director da Academia de Belas Artes do Porto
até à implantação da República, quando é substituído pelo arquitecto José
Marques da Silva (1869-1947), assume em 1913 o cargo de director do então
criado Museu Soares dos Reis então em S. Lázaro. Em 1926 abandona a docência na
Escola de Belas Artes, vindo a falecer em 1927.
[36] Ribeiro Arthur (Bartolomeu Sezinando Ribeiro
Arthur 1851-1910), Arte e Artistas Contemporâneos, Illustrações Casanova
& Ramalho, prefácio de Fialho de Almeida, Lisboa, Livraria Ferin 1896.
(pág. 321).
[38] Cecília (Benevides de Carvalho) Meireles
(1901-1964) Murmúrio in Viagem (1929-1937) in Poesia Completa,
Companhia Aguilar Editora Rio de Janeiro 1994.
[39] Cesário Verde O Livro de Cesário Verde, Em
Petiz II Os Irmãosinhos Lisboa Typographia Elzevirana Rua do Instituto
Industrial, 23 a 31, 1887. (pág.73)
[40] António Carvalho da Silva Porto (1850 – 1893). Nascido
na freguesia da Sé, na cidade do Porto, acrescentou o apelido Porto ao seu nome
numa homenagem à sua cidade natal. Em 1865, matriculou-se na Academia Portuense
de Belas Artes. Em 1873, parte para Paris como bolseiro, com João Marques de
Oliveira, onde frequentam a École de Beaux Arts. De regresso a Portugal em
1879, é convidado para reger a cadeira de Paisagem, na Academia de Belas Artes
de Lisboa, e torna-se um dos dinamizadores do grupo do Leão. Em 1885, quando
Columbano pinta o "Grupo de Leão" O Correio da Manhã de 20 de Abril
descreveu Silva Porto da seguinte forma: "O Cristo daquela ceia
chocarreira não sorri, e parece longe (...) imerso na doce melancolia poética
que ninguém lhe arranca, e com o espírito flutuando em mundo cor de safira e
luar!". (Antigos Estudantes da Universidade do Porto. www.sigarra.up
.pt). E Fialho d’Almeida descreve-o como: “Discreto, pequenino, o ar d’ hum
Christo que tivesse pedido feriado na ceia dos apostolos.” Silva Porto irá
participar em todas as exposições do Grupo do Leão e do Grémio Artístico, sem
deixar de participar nas exposições realizadas no Ateneu Comercial do Porto,
até à sua prematura morte em 1893.
[41] Ramalho Ortigão - Jonh Bull Depoimento
de uma testemunha da vida e da civilização ingleza. Livraria Internacional
de Ernesto Chardron. Lugan & Genelioux, Sucessores. Porto. 1887. (pág.51).
[42] Júlio Diniz (Joaquim Guilherme Gomes Coelho), Uma
Família Ingleza, Scenas da Vida do Porto, Terceira edição Porto, Em casa de
A. R. da Cruz Coutinho, Editor 18—Rua dos Caldeireiros—20, 1875. (páginas 201 a 205).
[43] Lady Jackson (Catherine Hannah Charlotte
Elliott) - Fair Lusitania [1874] – A Formosa Lusitânia, versão do
inglez prefaciada e anotada por Camillo Castello Branco Livraria Portuense
Editora 121 Rua do Almada 123, Porto 1878. (pág.299).
[45] Júlio Diniz (Joaquim Guilherme Gomes Coelho
(1839-1871),Uma Família Ingleza, Scenas da Vida do Porto, Terceira
edição Porto, Em casa de A. R. da Cruz Coutinho, Editor 18—Rua dos
Caldeireiros—20, 1875. (páginas 201 a 205).
[46] Camillo Castelo Branco (1825-1890), A
brazileira de Prazins : scenas do Minho, Porto , Ernesto Chardron -
Editor, 1882. (pág.221).
[47] Maria Aurélia Martins de Souza (1866 -1921).
Entre 1893 e 1898, com a sua irmã Sofia de Souza (1870-1960), frequentou a
academia Portuense de Belas Artes, cujo curso não chegou a completar. Ainda
como estudante participou em diversas exposições quer promovidas pela Academia
quer pelo Ateneu Comercial do Porto. Em 1899, parte para Paris onde frequenta a
Academia Julien, e onde a sua irmã Sofia a vem acompanhar em 1900. Em 1902,
antes do regresso a Portugal, as duas irmãs dedicaram-se a viajar pela Europa, visitando
a Bélgica, a Alemanha, a Itália e a Espanha. Participa de 1909 a 1921 nas
exposições da Sociedade de Belas-Artes do Porto, nas Galerias da Misericórdia
do Palácio de Cristal no Porto, e da Sociedade Nacional de Belas-Artes de
Lisboa.
[48] José Augusto França (1922), História da Arte em
Portugal, O Pombalismo e o Romantismo,
Editorial Presença Lisboa 2004.
[49] Henry Charles Bukowski (1920-1994) Something
For The Touts, The Nuns The Grocery Clerks, And You . . . in The
Pleasures of the Damned, Poems 1951-1993, Edited by John Martin,
HarperCollins Publishers, N.Y. 2008. Tradução: ...Três / geraniums de fora
de uma janela, tentando ser/ vermelhos e tentando ser/ cor-de-rosa e tentando
ser /geraniums…
[50] Eugénio de Andrade (1923-2005), Pequena
Elegia de Setembro in Coração do Dia (1958). In Eugénio de Andrade Poesia. Assírio & Alvim, Porto
Editora 2017. (pág. 98).
[51] Eugénio de Andrade, “Também, também o pulso”
de “Contra A Obscuridade” (1988). In Eugénio de Andrade Poesia. Assírio & Alvim, Porto
Editora 2017. (pág.411).
[52] (Oscar) Claude Monet (1840-1926) o mais
conhecido dos Impressionistas sendo um dos seus quadros “Impression: Soleil
Levant” de 1874 que provocou o nascimento do movimento.
[53] (José Duarte) Ramalho Ortigão (1836-1915), O
Porto Julho de 1883 in As Farpas I décimo Volume pag.88 Círculo dos
Leitores 1988. (pág.88).
[54] Joseph Mallord William Turner (1775-1851),
pintor do período romântico foi considerado um percursor do Impressionismo e da
pintura moderna.
[55] Eugénio de Andrade, “Conhecias o verão pelo cheiro” poema 7 de “Matéria Solar”
(1980). In Eugénio de Andrade Poesia. Assírio
& Alvim, Porto Editora 2017. (pág.329).
[56] Fernando Pessoa (1888-1935), Cancioneiro poema [128] 4-3-1931, in Fernando
Pessoa, Obra Poética, Volume Único, Rio de Janeiro, GB, Companhia Aguilar
Editora, 2.ª edição,1965. (pág.157).
[57] Armando Basto (Armando Pereira Bastos de
Loureiro, 1889-1923). Frequentou a Academia Portuense de Belas Artes entre os
anos de 1903 e 1910. Em 1910 viajou para Paris por formar a completar os seus
estudos, onde frequenta a Cité Falguière, de Montparnasse, expõe no Salon des Humoristes, no Palais de
Glace. É também neste período que a tuberculose, que o viria a vitimar, se
manifesta obrigando à sua hospitalização em 1914.Em 1915 regressou a Portugal,
participa na primeira Exposição de Humoristas no Jardim Passos Manuel Porto) e
na de Modernistas expôs em 1918 na Galeria da Misericórdia, no Porto, muitos
dos seus desenhos eram assinados com um "A" dentro de um quadrado ou
com o pseudónimo Boulemiche. Morreu
de tuberculose em 1923.
[58] Eduardo Afonso Viana (1881-1967). Depois de
frequentar a Academia de Belas-Artes de Lisboa parte para Paris em 1905 e aí
permanece até 1915. Entretanto envia diversos trabalhos para as Exposições.
Entre 1915 e 1917, convive com Sónia e Robert Delaunay, que fugindo da I Guerra
se instalam em Vila do Conde na Av. Bento de Freitas. Em 1919 participa no III
Salão dos Modernistas do Porto; em 1920, Expõe individualmente no Porto na
Galeria da Santa Casa da Misericórdia em 1921.
[59] Camillo Castelo Branco (1825-1890), A
brazileira de Prazins: scenas do Minho, Porto , Ernesto Chardron -
Editor, 1882. (pág.89).
[60] Eça de Queiroz (1845-1900), Os Maias” Livraria Internacional de
Ernesto Chardron: Casa Editora Lugan & Genelioux Successores, Porto 1888.
(pág,11).
[61] Eça de Queiroz e Ramalho
Ortigão, “À
ex.ª Camara Municipal do Porto ou a quem suas vezes fizer” in As Farpas, III série, Tomo II. Janeiro 1878. Typographia
Universal, Lisboa 1878. (pág.66 a 68).
[63] Pablo Neruda (1904-1973) Los Puentes, in Las
uvas y el viento 1954, Obra s Escogidas Tomo I, Editorial Andre Bello
Santiago del Chile 1972. Tradução: E passa o rio/debaixo das novas
pontes/cantando com a história/palavras puras/que encheram a terra.
Excelente!
ResponderEliminarBoa tarde senor Figueiredo,
ResponderEliminarHe podido disfrutar de su excelente trabajo, un fantástico viaje al Duero de mano de literatos y pintores.
obrigado pelos comentários!
ResponderEliminarOutra pintura do Areínho, de Sofia Martins de Sousa: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:%22O_Areinho%22_-_Sofia_Martins_de_Sousa.png
ResponderEliminarPoder-me-ia indicar alguns elementos mais sobre o pintor referenciado como F. Peixoto? Antecipadamente grato. Cumprimentos.
ResponderEliminarAmérico Conceição