Apontamento
10 - Descrição de Sevilha a partir da imagem de Braun e Hogenberg
1588
cap. 1
Leonido a Riselo
A que bueno es, Riselo; la venida,
truxoos
a caso la opinion famosa
desta insigne ciudad, mapa del mundo?
teneis
algunas barras de las Indias
en la
contratacion? O aveis venido
a la
voz de sus ricos casamentos? [1]
Em 1588,
no tempo de Felipe II de Espanha (e primeiro de Portugal), é publicada no
volume IV do Civitates Orbis Terrarum
uma vista de Sevilha, realizada a partir de uma semelhante, desenhada em 1585
por Ambrosio Brambilla (activo 1579–1599) e publicada por Pietro de Nobili
(15??-15??).
fig. 1
- Sevilha 1588 no Civitates Orbis Terrarum de Georg Braun (1542-1622) e Franz Hogenberg (1535-1590),
A imagem de Sevilha, tem na
parte superior, da esquerda para a direita, as armas da cidade de Sevilha; ao
centro as armas do rei Felipe II (1527-1598), junto ao título; e, à direita, o
escudo dos condes de Olivares (Enrique de Guzman (1540–1607), 2º Conde Duque de Olivares, que foi conselheiro de Felipe II[2]).
fig. 3 – Pormenor da parte superior da imagem Sevilla do Civitates Orbis Terrarum 1588.
Na parte inferior tem uma legenda com os edifícios e os espaços
públicos numerados (1 a 40).
fig. 4
- Pormenor da parte inferior da imagem Sevilla do Civitates Orbis Terrarum
1588.
Estas imagens, apresentadas em vista de pássaro (a vol d’oiseau), mostram já a conformação urbana da Sevilha do século XVI, na transição da cidade medieval para a cidade renascentista e barroca.
Nestas imagens, a cidade de Sevilha, orientada no sentido
nascente-poente, ainda apresenta uma conformação medieval, dominada pela Catedral
e cinturada pela muralha, com 15 portas, entre as quais as ruas estruturam o
tecido urbano e abrem para o Guadalquivir e para os campos e as povoações nos
arrabaldes extramuros, pontuados pelos mosteiros e hospitais.
Sevilha era já uma cidade com uma grande e diversificada
população, fruto do enriquecimento das navegações, e Miguel de Cervantes, que
entre 1600 e 1604 residiu em Sevilha, escreve no D. Quixote que “… le rogaron se viniese con ellos a Sevilla,
por ser lugar tan acomodado a hallar aventuras, que en cada calle y tras cada esquina
se ofrecen más que en otro alguno.”
[3]
E em Rinconete y
Cortadillo, Cervantes lembra a sua impressão de Sevilha: “…se fueron a ver la ciudad, y
admiróles la grandeza y sumptuosidad de su mayor Yglesia, el grã cõcurso de
gente del río, porque era en tiempo de cargazón de flota y avía en él seys
galeras, cuya vista les hizo suspirar y aun temer el día que sus culpas les
avían de traer a morar en ellas de por vida...” [4]
Mas, embora populosa
(cerca de 100 000 habitante), na imagem do Civitates apenas surgem, em primeiro plano, desenhadas algumas
personagens, e umas quantas apontadas no areal junto da muralha da cidade,
Os autores, pretendem sobretudo mostrar a cidade física, uma urbe bem organizada e limpa, com a sua estrutura urbana (a arquitectura da cidade), bem limitada pela muralha, e com os seus espaços públicos e os seus conjuntos edificados onde de erguem os seus principais e marcantes edifícios (as arquitecturas da cidade).
Destaca-se o rio Guadalquivir (antigo Bétis), com inúmeras
embarcações fundeadas.
[Sevilha
é uma cidade numa zona plana, na margem esquerda do Bétis, a que chamam agora
de Guadalquivir, com um perímetro de quatro a cinco milhas, mais semelhante às
cidades de Itália, que outras cidades de Espanha, e tem ruas largas e belas,
mas as casas na maior parte dos casos não são muito boas…]
A vista de Sevilha atribuída a Alonso Sanchez Coello
fig. 5 - (Atribuído) Alonso Sanchez Coello (1531-1588), óleo s/ tela, 146 x 295 cm. Museu do Prado e Museu da América.
Sob um céu de pesadas nuvens, que um encoberto sol poente, cria dinâmicas diagonais anunciando tempestades e dramatizando o ambiente, Sanchez Coello pinta uma panorâmica de Sevilha, abrangendo e destacando as margens do Gualdalquivir.
“…Y de su hermoso Arenal
sólo se precia Sevilla,
que es otava maravilla,
y una plaça universal.” [6],
Na outra margem, em
primeiro plano, os cais do arrabalde de Triana.
[1] Lope de
Vega Carpio, (1562-1635), Comedia Famosa
del testigo contra si in Sexta parte de sus comedias. En Madrid, Por la
viuda de Alonso Martin, A costa de Miguel de Siles librero, vendese en su casa.
Madrid 1615. (Acto I Pág. 234) BNE.
[2] O Conde
de Olivares que se tornou mais conhecido foi o filho Gaspar de Guzman
(1587-1645), o Conde–Duque de Olivares, ministro de Felipe IV.
[3] Miguel
de Cervantes, El Ingenioso Hidalgo Don
Quixote de la Mancha. Compuesto por Miguel de Cervantes Saavedra. Por Iuan
de la Cuesta Madrid Ano 1605. (Cap. XIIII pág.58).
[4] Miguel de Cervantes, Riconete y Cortadillo in Novelas Exemplares de
Miguel de Cervantes Saavedra. En Madrid por Iuan de Cuesta Año 1613. Madrid,
1613 (pág.69). BNE.
[5] Andrea
Navagero (1483-1529), Il Viaggio fatto in
Spagna, et in Francia, dal Magnifico M. Andrea Navagiero, fu oratore
dell’Ilustrissimo Senato Veneto, alla Cesarea Maesta di Carlo V. Com la
descrittione particolare delli luochi, & costumi delli popoli di quele
Provincie. In Vinegia apresso Domenico Farri. 1563. (pág. 13).
[6] Lope de
Vega Carpio (1562-1635), El Arenal de Sevilla... sacadas de sus originales
...onzena parte, En Barcelona: por Sebastian de Cormellas, y à su costa,
Barcelona 1618. Biblioteca Virtual Miguel Cervantes. (fol. 223). (Acto I, pág. 226).
Cap. 2
O Arenal de Sevilha
“…Y de su hermoso Arenal
sólo se precia Sevilla,
que es otava maravilla,
y una plaça universal.” [1]
fig. 6
– O Arenal. Pormenor de Sevilha 1588 no Civitates Orbis Terrarum de Georg Braun (1542-1622) e Franz
Hogenberg (1535-1590). Foi realçada a vermelho a numeração correspondente à
margem do Guadalquivir.
A imagem do Civitates, junto ao Guadalquivir, salienta o Arenal, o centro da vida e das
actividades da cidade, onde Lope de Vega põe na boca da personagem D. Lope
Cavallero:
“Sembrando en tu Arenal mis esperanças,
O Sevilla que fruto serà el mío,
que ni del llanto,
bastará el rozio,
ni del ligero tiempo
las mudanças.
O tu que del Ocaso al
Norte alcanças,
pensamiento menor que
el desvario,
si en el arena siembras de este rio,
tu cosecha será desconfianças.
Si comparas tu arena con mis males,
tú ni la Libia de
montañas llena,
teneys bastante copia
de Arenales.
O principio terrible
de mi pena,
Si en él son las
arenas desiguales,
qué fin espero de
sembrar tu arena?” [2]
O Arenal era a
zona portuária, uma extensa faixa com aproximadamente 650 metros, entre o rio e
a muralha desde a Ponte Triana (39) - uma ponte de barcas, que ligava as duas
margens do rio Guadalquivir (antigo Bétis), em frente da Porta do mesmo nome
(25) – até à Torre del Oro (36) e ao cais onde se descarregavam os navios (38).
Na imagem vemos as embarcações fundeadas ou atracadas ao longo da margem do Guadalquivir, de um modo geral fundeadas na perpendicular à margem, para permitir um melhor aproveitamento do espaço dos cais e atracar um maior número de navios.
Os navios mais pesados, como dificilmente podiam subir o Guadalquivir, atracavam em San Lucar (ou Sanlucar) de Barrameda e as suas cargas eram transportadas para Sevilha em embarcações de menor dimensão. (ver Apontamento 9).
Mas, apesar da quantidade de navios atracados, não se
mostram as muitas actividades e as inúmeras pessoas que certamente, se
aglomeravam nesta frente ribeirinha.
De facto, Lope de Vega Carpio, inicia a sua, já aqui citada,
comédia intitulada El Arenal de Sevilla, com
um diálogo entre as suas personagens “D.
Laura y D. Urbana su tia com mantos” - que bem podiam ser as personagens
representadas na parte inferior da imagem de Braun – salientando essas
actividades.
fig. 7
- Pormenor de Sevilha 1588 no Civitates
Orbis Terrarum de Georg
Braun (1542-1622) e Franz Hogenberg (1535-1590),
Dizem estas personagens:
“Laura.
Famoso està el Arenal.
Urbana
Cuando lo dexò de ser?
Laura.
No tiene a mi parecer
todo el mundo, vista igual,
Tanta Galera y Navio,
mucho al Betis engrandece.
Urbana
Otra Sevilla parece,
que està fundada en el
rio.
Laura.
Como llegan a Triana
pudieran servir de
puentes
Urbana
No le
he visto con mas gente.” [3]
Por contraste, na pintura de Sanchez Coello pode observar-se o que seria, de facto, a febril actividade portuária no Arenal e os diversos tipos de embarcação, as quais, à direita da imagem, mostram as salvas de canhão que saudavam a chegada dos navios das Índias.
Ou como refere Lope de Vega.
“Pues aguardad una flota,
y veréis toda esta arena
de carros de plata llena,
que imaginarlo alborota” [4]
fig. 8 – O Arenal. Pormenor de Alonso Sanchez Coello (1531-1588), óleo s/ tela, 146 x 295 cm. Museu do Prado/Museu das Américas
[1] Lope de
Vega Carpio (1562-1635), El Arenal de Sevilla... sacadas de sus originales
...onzena parte, En Barcelona: por Sebastian de Cormellas, y à su costa,
Barcelona 1618. Biblioteca Virtual Miguel Cervantes. (fol. 223). (Acto I, pág. 226).
[2] Lope de
Veja Carpio (1562-1635), Comedia Famosa del Arenal de Sevilla (1603) de Lope de
Vega Carpio. In Doze comedias de Lope de Vega Carpio ... sacadas de sus
originales ...onzena parte, En Barcelona: por Sebastian de Cormellas, y à
su costa, Barcelona 1618. Biblioteca Virtual Miguel Cervantes. (fol. 223). (Acto I, pág. 229).
[3] Lope de
Veja Carpio (1562-1635), Comedia Famosa del Arenal de Sevilla de Lope de Vega in
Doze comedias de Lope de Vega Carpio ... sacadas de sus originales ...onzena
parte, En Barcelona: por Sebastian de Cormellas, y à su costa, 1618
Biblioteca Virtual Miguel Cervantes. (fol. 223). [Sebastian de Cormellas
(1593-1667)].
[4] Lope de
Veja Carpio (1562-1635), Comedia Famosa del Arenal de Sevilla de Lope de
Veja.,in Doze comedias de Lope de Vega Carpio ... sacadas de sus originales
...onzena parte, En Barcelona: por Sebastian de Cormellas, y à su costa,
1618 Biblioteca Virtual Miguel Cervantes. (pág. 226).
Cap. 3
O Cais
fig. 9 – O Cais. Pormenor de Sevilha 1588 no Civitates Orbis Terrarum de Georg Braun (1542-1622) e Franz Hogenberg (1535-1590).
(38) El Muelle. A grua ou “ingienio” do porto
Alonso Morgado (c.1520-d.1589) na sua Historia de Sevilla, refere:
“Y como toda esta Riqueza venga por Guadalquivir, puede bien contarse por una de sus excelencias. Y entre ellas su alto, y fuerte Muelle de dos Ruedas, que de tiempo inmemorial sirve junto ala Torre del Oro, para el servicio de su gran Puerto.” [1]
No local do desembarque dos metais preciosos é representada a grua ou “engenho” do porto (38).
fig. 10
– A Grua do porto. Pormenor de Sevilha
1588 no Civitates Orbis Terrarum de
Georg Braun (1542-1622) e Franz Hogenberg (1535-1590).
A grua surge, parcialmente representada, na extremidade direita da pintura de Sanchez Coello.
fig. 11
- A grua parcialmente representada na
extremidade da pintura de Sanchez Coello.
Utilizadas desde a Idade Média para içar
grandes pesos, sobretudo na construção de grandes edificações como as
catedrais, e conhecidas por “gaiolas de
esquilo” eram movimentadas por um ou mais homens que caminhavam no interior
das grandes rodas laterais.
fig. 12
- Histoire ancienne jusqu'à
César 1260-1270, 274 folhas , miniatura em pergaminho 37 x 23,5 cm.
Bibliothèque municipale de Dijon Bourgogne France.
fig. 13
- Diebold Schilling (c.
1445–1485), Spiezer Chronik 1480/89 Paper · 806 pp. ·
37 x 26 cm Bern Virtual Manuscript Library of Switzerland (pág. 81). https://www.e-codices.unifr.ch/de/bbb/Mss-hh-I0016/81/0/Sequence-50
fig. 14 -
Jean Ballesdens, Speculum humanae salvationis. 1301-1500, manuscrito em latim
c/iluminuras, em pergaminho. BnF. Bibliothèque nationale de
France. Département des Manuscrits. ark:/12148/btv1b6000434v
A partir do
século XVI, tornam-se frequentes nos cais fluviais e marítimos.
fig. 15
- Simon
Bening (c. 1483-1561) Le port de Bruges Calendário 66páginas pergaminho
14 × 10, cm. Oktober, Kalendarium eines flämischen Stundenbuches (Brügge) Bayerisches
Stadtbibliotheck Munich
A
grua “gaiola de esquilo” está
representada no célebre quadro de Pieter Brueghel o velho (c.1525/30-1569), A Torre de Babel de 1563, mostrando como
desde a Idade Média se utilizavam para içar as grandes pedras e outros
materiais na construção de grandes edifícios.
fig. 16
- Pieter Bruegel ou Brueghel o velho (c. 1525/30-1569). Torre de Babel
1563, óleo s/ madeira, 115 x 114 cm. Kunsthistorisches Museum, Vienn.
fig. 17
- Pormenor de Torre de Babel 1563, óleo s/ madeira, 115 x 114 cm. Kunsthistorisches
Museum, Vienn.
fig. 18 - Pormenor de Torre de Babel 1563, óleo s/ madeira, 115 x 114 cm. Kunsthistorisches Museum, Vienn.
A
grua do porto de Sevilha era propriedade da Catedral e foi inicialmente
utilizada para desembarcar os materiais para a sua construção.
Permaneceu no porto para carregar e descarregar as mercadorias que ali chegavam, sobretudo a prata e o ouro das Américas que ali eram desembarcados.
Como afirma Alonso Morgado ali eram descarregados “(…) asaber de Agua, de
Vino, Azeyte, Leche, Miel, Açucar, y los otros dos de Oro, y Plata por los Millones, que delas Provicias del Piru, y de la nueva España, le entran todos los años.” [2]
Lope de Vega, numa outra das suas comédias, intitulada Servir a señor discreto, coloca duas personagens, Dom Pedro e Girón, a falar de Sevilha e dos “barcos de Plata” carregados de ouro e prata, ou seja, as naus que chegavam das Américas, trazendo, sobretudo, a prata vinda das minas de Potosi na actual Bolívia.
“Sale don Pedro, y Giron.
Pedro
Para alabar a Sevilla
Dexa su contratacion,
Y quanto enciera
Giron,
De Gualdalquivir la
orilla.
Dexa la Torre del Oro,
y aquellos Barcos de Plata
en que el Indio mar desata
su màs precioso tesoro.” [3]
E Lope de Vega numa comédia significativamente intitulada El Nuevo Mundo descubierto por Christoval Colon, (onde uma das personagens é o Rei de Portugal), a sua personagem Idolatria, exclama:
“No permitas
Providencia
hazerme esta
sinjusticia,
pues los lleva la
codicia
a hazer esta
diligencia.
Socolor de Religión,
van a buscar plata y oro
del encubierto tesoro.” [4]
[1] Alonso
Morgado, Historia de Sevilla en la cual se contienen sus antigüedades,
grandezas y cosas memorables en ella acontecidas desde su fundación hasta
nuestros tiempos, Compuesta y ordenada por Afonso Morgado, indigno
Sacerdote, natural de la villa de Alcantara, en Estremadura. En la Imprenta de
Andrea Perscioni y Ioan de Leon Sevilla 1587. (libro segundo pág.174).
[2] Alonso
Morgado, Historia de Sevilla en la cual se contienen sus antigüedades,
grandezas y cosas memorables en ella acontecidas desde su fundación hasta
nuestros tiempos, Compuesta y ordenada por Afonso Morgado, indigno
Sacerdote, natural de la villa de Alcantara, en Estremadura. En la Imprenta de
Andrea Perscioni y Ioan de Leon Sevilla 1587. (Libro segundo pág. 165).
[3] Lope de
Veja Carpio (1562-1635), Servir a señor discreto in Doze comedias de Lope de
Vega Carpio ... sacadas de sus originales ...onzena parte, En Barcelona:
por Sebastian de Cormellas, y à su costa, 1618. Biblioteca Virtual Miguel
Cervantes. (fol.97).
[4] Lope de
Vega Carpio, El Nuevo Mundo descubierto por Christoval Colon. in Doce Comedias
sacadas de sus originales. Miguel Serrano de Vargas, Madrid, Año 1614.
(pág. 35).
Cap. 4
Sevilha numa pintura do século XVI
Uma imagem existente na igreja de Santa Ana, atribuída ao
Mestre de Moguer, entre Santa Justa e Santa Rufina, as duas santas patronas de
Sevilha, surge, ao centro, uma reduzida e simplificada representação de
Sevilha.
fig. 19
- Maestro de Moguer (14__-15__), Santa Justa e Santa Rufina, c. 1515. Óleo
s/madeira. Igreja de Santa Ana, Sevilha.
Entre
as duas Santas reconhece-se a torre (o antigo minarete) da Catedral, ainda sem
as intervenções renascentistas que lhe darão o nome de Giralda, e destaca-se o Arenal onde uma âncora simboliza o
porto, com o “ingienio” (a grua).
fig. 20 - Maestro de Moguer (14__-15__), Pormenor de Santa Justa e Santa Rufina, c. 1515. Óleo s/madeira. Igreja de Santa Ana, Sevilha.
Na
outra margem do Guadalquivir, atravessando a ponte de barcas de Triana, o
arrabalde do mesmo nome, com o Castelo de São Jorge (sede da Inquisição) e a
igreja de Santa Ana onde, aliás, o quadro se encontra.
fig. 21 - Maestro de Moguer (14__-15__), Pormenor de Santa Justa e Santa Rufina, c. 1515. Óleo s/madeira. Igreja de Santa Ana, Sevilha.
Na
parte inferior da pintura, três peças de barro, indicando que as duas santas se
dedicaram à olaria, aliás a produção tradicional de Triana.
fig. 22 - Maestro de Moguer (14__-15__), Pormenor de Santa Justa e Santa Rufina, c. 1515. Óleo s/madeira. Igreja de Santa Ana, Sevilha.
Agustin de Rojas Villandrando (1572-c.1635), o autor da Comedia El viagem entretenido publicada em 1603, numa cena entre quatro das suas personagens, Ramirez, Rios, Solano e Rojas, aponta as olarias de Triana e o fabrico artesanal dos azulejos.
“Ramirez.
Por lo que dixistes de Triana:
aveys notado, la loza q a yen ella?
Rios.
A propósito fray jarro.
Solano.
Por esso q dezis de albarda, mi
padre tiene una ratonera de golpe.
Rojas.
Oydo he dezir q ay mas de
sesenta tendas, dõde se haze y vende, ansi vedriado como amarillo y blanco, y
aun muy buenos azulejos de diferêtes colores.” [1]
A Torre del Oro (36)
Á direita da imagem do Civitates, a Torre del Oro (36), que defendia o acesso ao porto.
fig. 23 – Pormenor de Sevilha 1588 no Civitates Orbis Terrarum de Georg Braun (1542-1622) e Franz Hogenberg (1535-1590).
fig. 24 – Pormenor de Sevilha 1588 no Civitates
Orbis Terrarum de Georg
Braun (1542-1622) e Franz Hogenberg (1535-1590).
Em 1570 Felipe II faz uma entrada triunfal em Sevilha.
Desta
visita existe um relato de Juan de Mal Lara (1524-1571)
– que, aliás, participou na organização da recepção ao monarca - com o título de
Recibimiento que hizo la muy noble y muy leal ciudad de Sevilla a la C. R. M.
del Rey don Felipe N. S. Con una breve descripción de la ciudad y su tierra. [2]
Nessa publicação e como o título indica, Mal Lara para além de descrever essa entrada triunfal, acrescenta alguns elementos da Sevilha do século XVI.
Refere Juan Mal Lara:
A Torre del Oro “…que es grande y alta, dozavada com doze Garitas, que salen una en
cada ángulo, hazíendo proporción hermorsíssíma para desde alli defender a los que quisieren picar lo torre.” [3]
E Lope de Vega escreve no Arenal de Sevilla:
“Mejor será que lleguemos
hasta la Torre del Oro
y todo ese gran tesoro
que va a las Indias veremos.”
[4]
A Torre del Oro na pintura de Sanchez Coello.
fig. 25
– A Torre del Oro na pintura de Sanchez Coello.
Entre a porta del
Carbón e a Torre del Oro, está representada a importância
do trabalho da madeira na época. As tábuas espalhadas no solo indicam a actividade
da construção naval e da arte dos tanoeiros.
fig. 26
– Entre a Catedral e a Torre del Oro. Pormenor do quadro atribuído a Alonso
Sanchez Coello (1531-1588), óleo s/ tela, 146 x 295 cm. Museu do Prado/Museu
das Américas
(37) A Torre dela Plata
Como já apontamos, (no
Apontamento 8), a Torre da Prata estava inserida na muralha e era, como o nome
indica, o local de armazenamento da prata descarregada dos navios vindos da
América, sobretudo das minas de Potosi na actual Bolívia.
fig. 27
- Torre dela Plata. Pormenor de Sevilha 1588 no Civitates Orbis Terrarum de Georg Braun e Franz Hogenberg.
Depois de desembarcados, a prata e o ouro, eram conduzidos em carros de bois para as respectivas torres e daí para a Casa da Contratação.
Escreve
Alonso Morgado:
“Cosa es de admiracion y no vista en outro Puerto alguno, las Carretas
de a quatro bueyes, que en tiempo de Flota acarrean la suma riqueza de Oro y
Plata en Barras desde Guadalquivir hasta la Real Casa de la Contratacion de la
Indias.” [5]
[1] Agustin
Rojas (1572-c,1635), El viagem entretenido de Agustin de Rojas, natural de
Madrid. En la Empreta Real Madrid M. DC. III. (pág. 56 e 57). BNE.
[2] Juan de
Mal Lara, Recibimiento que hizo la muy noble y muy leal ciudad de Sevilla a la
C. R. M. del Rey don Felipe N. S. Con una breve descripción de la ciudad y su
tierra, impreso en Sevilla, en casa de Alonso Escrivano, en la calle de la
Sierpe. Acabóse a veinte y nueve días del mes de Agosto. Sevilla Año de mil y
quinientos y setenta. Sevilla 1570.
[3] Juan de
Mal Lara (1524-1571), Recibimiento que hizo la muy noble y muy leal ciudad de
Sevilla a la C. R. M. del Rey don Felipe N. S. Con una breve descripción de la
ciudad y su tierra. En casa de Alonso Escrivano, Sevilla, 1570. (pág. 40).
[4] Lope de
Veja Carpio (1562-1635), El Arenal de Sevilla in Doze comedias de Lope de Vega
Carpio... sacadas de sus originales... onzena parte, por Sebastian de
Cormellas, y a su costa, Barcelona 1618. (pág. 223a).
[5] Alonso Morgado,
Historia de Sevilla en la cual se contienen sus antigüedades, grandezas y cosas
memorables en ella acontecidas desde su fundación hasta nuestros tiempos, Compuesta
y ordenada por Afonso Morgado, indigno Sacerdote, natural de la villa de
Alcantara, en Estremadura. En la Imprensa de Andrea Fescioni y Iuan de Leon
Sevilla 1587. (libro segundo pág. 166).
Cap. 6
As portas do Arenal
O Arenal
comunicava com a cidade através de um conjunto de Portas e Postigos que com as
outras portas da muralha davam acesso às vias que estruturavam a cidade.
fig. 28 – As portas do Arenal. Pormenor de Sevilha 1588 no Civitates Orbis Terrarum de Georg Braun (1542-1622) e Franz Hogenberg (1535-1590).
Da direita para a esquerda:
Do lado do Tagarete, a Porta de Gerez (Xerez ou Jerez) (35);
A Porta ou Postigo do Carbon (escrito na própria imagem), entre
a Torre della Plata e as Atarazanas;
A Porta do Arenal (24);
A Porta de Triana (25).
Ainda na continuidade do Arenal e para além da ponte de
Triana (39), estava a Puerta de Goles (26).
(35) Puerta de Gerez (Porta de Jerez ou Xerez)
fig. 29
- Puerta de Jerez (33). Pormenor de Sevilha 1588 no Civitates Orbis
Terrarum de Georg Braun e
Franz Hogenberg.
A Porta de Jerez, como aparece na imagem, abria para uma prquena ponte que transpunha o Tagarete, o afluente do Guadalquivir, que corria junto à muralha.
Segundo Rodrigo Caro (?-?), na sua Antiguedades y Principiado de la Ilustrissima Ciudad de Sevilla, publicada já em 1634, na porta de Xerez, em 1578, e “en una tabla de marmol blanco se vem estas letras”:
“Hercules me edificò
Iulio Cesar me cercò
De muros y torres altas,
Y el Rey Santo* me ganò
Com Garcia Perez de Vargas**.” [1]
[*O Rei Santo era Fernando
III (1201-1252) que conquistou a cidade aos mouros.
**Garcia Pérez de Vargas foi um dos 24
cavaleiros que acompanhou Fernando III na sua campanha da Reconquista em
Andaluzia.]
Sevilha, tradicionalmente fundada por Hércules e povoada por Júlio César, já era cantada por Alfonso Villasandino no século XIV.
“Hércoles que hedificó
La cibdat muy poderosa,
Su alma ssea gozossa
Que tal cibdat ordenó.
Por Sevilla demostró
En su muy alto ssaber
Que se avie de noblezer
Por Julio que la pobló.
Con ssaber é poderío
Estos dos la ordenaron,
E los que en ella poblaron
Fué proeza é muy grant brío,
Vigío é prez é amoryo,
Lealtanca é lindo amor:
Syenpre byve syn pavor
Bryberas del su grant rryo.” [2]
Alonso Morgado refere que nas Gradas na direção da Porta de Xerez se comerciavam, para além do ouro e da prata, muitas outras mercadorias, e também os escravos
“A cerca de lo qual se puede notar por grandeza de Sevilla, la continua, perpetüa, y grãde abundancia de prendas de grã valor, que allí se rematan, assi de Oro, y Plata labrada, como de grandes Possessiones, Ropas costossissimas, Tapicerias riquíssimas y muchissimos Esclavos, con toda suerte de Armas, y quantas riquezas puedan imaginarse.” [3]
E
Miguel Cervantes nas Novelas Exemplares
refere a Puerta de Jerez quer em Coloquio de perros: “Un
día acometió en la puerta de Jerez
él solo á seis famosos rufianes, sin que yo le pudiese ayudar en nada, porque
llevaba con un freno de cordel impedida la boca; que así me traía de día, y de
noche me le quitaba.” [4]
Quer na novela: La espanola Inglesa: “…jamás visito el río,
ni pasó á Triana, ni vió el común regocijo en el campo de Tablada y puerta de Jerez, el día, si le hace
claro, de San Sebastián, celebrado de tanta gente, que apenas se puede reducir
á número;” [5]
[1] Rodrigo
Caro, Antiguedades y Principiado de la Ilustrissima Ciudad de Sevilla. Y
Chorographia de su Convento Iuridico, o antigua Chancilleria. En Sevilla, por
Andres grande. Impressor de Libros. Sevilla Año 1634. (pág. 6).
[2] Alfonso
Alvares de Villasandino (c.1345- c. 1424) in antologia de poetas líricos
castelhanos, ordenada por D. Marcelino Menendez Pelayo [1856-1912] Madrid 1890.
(pág. 94).
[3] Alonso Morgado, Historia de Sevilla Historia
de Sevilla en la cual se contienen sus antigüedades, grandezas y cosas
memorables en ella acontecidas desde su fundación hasta nuestros tiempos, Compuesta
y ordenada por Afonso Morgado, indigno Sacerdote, natural de la villa de
Alcantara, en Estremadura. En la Imprenta de Andrea Perscioni y Ioan de Leon
Sevilla 1587. (libro segundo pág. 169).
[4] Miguel
de Cervantes Coloquio de perros in Novelas exemplares. Tomo II. Imp. Y Lib. De
Jorge Montero, Valladolid 1905 (pág. 202).
[5] Miguel
de Cervantes, La española
inglesa in Novelas exemplares Tomo I. Imp. Y Lib. De Jorge Montero, Valladolid
1905 (pág. 231).
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