domingo, 7 de julho de 2024

poemas recuperados 28

 

Francis Bacon (1909-1992), autorretrato 1973. Óleo s/tela 198 x 147 cm. col. particular


Narciso decadente me fabrico no espelho

“Ayer se fue; mañana no ha llegado

hoy se está yendo sin parar un punto;

soy un fue, y un seré y un es cansado”. Francisco de Quevedo*

 

 Acumulando escondidas angústias ocultos revezes

ácidas ânsias em cada ano que a vida me foi dando

arrebatamentos que por vezes vivi quase ao acaso

em aventuras sem rasgo que sempre fui quebrando.

 

Discreta, confusa e banal personagem adormecida

vencido naquilo que não fui e no que pudera ter sido

obscura figura sem grandeza apenas distante na vida

meditando pelo que me calhou podia não ter nascido.

 

No correr da vida o que pudera ter sido e que não fui

púrpuras penumbras que vão ofuscando a claridade

miséria disfarçada no desdém de um agora já velho

 

Delicada alta montanha da esquecida dor do que vivi

que só no cume se sabe o lesto passar finito da idade

quando em narciso decadente me fabrico ao espelho.

 

*Francisco de Quevedo (1580-1645), Represéntase la brevedad de lo que se vive, y cuán nada parece lo que se vivió In Obras Completas de Don Francisco de Quevedo Villegas. Tomo terceiro y segundo de las poesias. Sociedad de Bibliofilos Andaluces. Imp. De Francisco de P. Diaz. Sevilla 1902 (pág. 382).


Sem comentários:

Enviar um comentário