Domingo, 15 de Janeiro de 1939. Teve grande impacto a amaragem de um avião alemão junto à Afurada.
Uma fotografia do
avião na Afurada
O Hidroavião alemão Nordmeer da Lufthansa na
Afurada.
Ilustração n.º 315 de 1 de Fevereiro de 1939.
Acompanhando a fotografia a seguinte legenda, que indica que o avião faria a viagem da Alemanha para a América do Sul via Açores: “O quadrimotor “Nordmeer” que acossado pelo temporal, fez uma amaragem forçada junto da barra do Douro, quando se destinava a Lisboa, na sua carreira da Alemanha à América do Sul. Os pilotos daquela barra conseguiram, após porfiados esforços, salvar o aparelho e os seus cinco tripulantes.” (Ilustração n.º 315 de 1 de Fevereiro de 1939.)
Os resultados do futebol que aos domingos são o assunto do dia não despertaram ontem interesse e a população citadina não falava em outra coisa, que não fosse o desastre do avião.
Dirigindo-nos ao local do suposto acidente,
verificamos que não se tratava de desastre, mas de amaragem normal, embora
forçada em consequência do mau tempo.
O hidroavião quadrimotor Nordmeer, de
nacionalidade Alemã, que faz carreira postal, entre a Alemanha e o norte de
África com passagem por Lisboa, tinha de facto amarado em frente ao lugar do
Ouro, mais propriamente na margem esquerda do rio, lugar de São Paio, devido ao
temporal; mas desastres materiais ou pessoais, não tinha havido.
O Nordmeer saíra da sua base de Travemunde,
Alemanha, com cinco homens de tripulação: comandante, piloto, 2º piloto,
telegrafista e mecânico, repectivamente snrs. Blume, Modroux, Stoltz, Amphlett
e Roesel e dirigia-se para Lisboa, donde levantaria, de novo, voo com destino a
Las Palmas.
O quadrimotor – um aparelho moderno e de linhas
elegantes – viera até Espanha, sem qualquer incidente e sem que o tempo
impedisse o prosseguimento da viagem. Ali, porém, o aparelho, apesar de
potentíssimo, devido ao vento impetuoso começou a lutar com dificuldades de
diferente ordem. O comandante ordenou que seguisse para Lisboa, no intuito de
encontrar melhores condições atmosféricas e, portanto, o aparelho poder descer
sem dificuldades.
Em breve, o telegrafista, firme no seu posto,
pôs-se em comunicação com a Rádio Telegráfica de Monsanto, recebendo informação
de que Lisboa, estava debaixo de violentíssimo temporal e seria difícil poisar
em boa ordem.
Nesta eventualidade, nova ordem do comandante
para sobrevoar o rio Douro e ver se o aparelho poderia amarar.
Assim sucedeu e a manobra fez-se facilmente,
sem que o aparelho sofresse a mais ligeira avaria.
Foi logo requisitada a presença de todas as
corporações de bombeiros desta cidade, cujos serviços não chegaram a ser utilizados
por serem desnecessários.
O Nordmeer foi rebocado, em seguida, para
próximo do Cabedelo, onde ficou a flutuar.
Os tripulantes desembarcaram mais tarde e
instalaram-se num hotel da cidade do Porto.
O aparelho espera que o temporal
passe para poder levantar voo em direcção a Lisboa, donde como acima se disse,
seguirá para Las Palmas.”
Na Quarta-feira, 18 de Janeiro o Diário de Lisboa dava notícia da partida do quadrimotor rumo a Lisboa: “Levantou vôo esta tarde, cêrca das 15 e 30, com rumo a Lisboa, o avião alemão “Nordmeer”, que se encontrava amarrado, no rio Douro, desde o passado domingo. O seu abastecimento foi feito esta manhã, tendo para esse efeito sido puxado mais para junto de terra, a fim de receber o combustível por intermédio duma mangueira assente sobre uma fileira de bateiras da Afurada. Antes de descolar fez algumas corridas a favor e contra a fortíssima corrente das águas, depois do que se ergueu normalmente, e evolucionou muito baixo sobre a cidade, seguindo em direcção ao sul.” (Diário de Lisboa 18 de Janeiro de 1939)
O “Nordmeer” (Mar do Norte) e o avião semelhante o “Nordwind” (Vento Norte), pertenciam à Deutsche Lufthansa (fundada em 1926).
Eram aviões com 25 metros de envergadura e 18 de comprimento e pesavam 16 toneladas.
Os quatro motores diesel
tinham, cada um, 600 cavalos de potência, sendo a velocidade de 250 Km/hora,
com um raio de acção de 5.000 quilómetros.
Este acontecimento veio (re)colocar a necessidade da construção de um aeroporto no Porto, já que o rio Douro não permitia a construção de um aeroporto para hidroaviões, então ainda os aviões mais utilizados na aviação comercial que se vinha desenvolvendo a partir do final da I Grande Guerra.
Em 1932 Ezequiel de Campos (1874-1965) no seu “Prólogo ao Plano da Cidade do Porto” já referia o assunto do aeroporto num capítulo intitulado Campos de Aviação.
Ezequiel de Campos localização do aeroporto do Porto. Pormenor da planta Traça das ruas primárias da Cidade do Porto no Prólogo ao Plano da Cidade do Porto de 1932
As reflexões sobre o Campo de Aviação de Ezequiel de Campos são o reflexo do que era a aviação comercial no início dos anos 30, que começava a dar os seus primeiros passos.
“Tem sido muito falado o campo de
aviação.
Não nos embrenhemos no caso. Referimos
apenas que o campo de aviação deve ficar tão perto quanto possível do centro da
Cidade: algumas centenas de campos de aviação modernos estão em média dentro de
quatro quilómetros e meio do centro urbano; outros a seiscentos metros; alguns
a vinte quilómetros, e mais —pela dificuldade de obter espaço livre no centro
da cidade. Alguns por isto se tem abandonado.
Não deve ficar a mais de vinte minutos
do centro da cidade por automóvel, e do porto de mar ou fluvial — por estradas
boas: para bem por linda avenida. E perto das estações de caminho de ferro.
O tamanho do campo de aviação é definido
pêlos aviões que o hão-de utilizar. Actualmente os aviões pesados levantam voo
em 600 metros horizontais, em pequena altitude; mas requerem maior espaço para
as eventualidades do motor. Há aviões que exigem 1.100 metros para levantar
voo. —Muitos feitios e formas de campos de aviação se têm usado.
Tirando a militar, parece que a aviação
comercial tende a decair das primeiras perspectivas. Sem apoio político, poucas
carreiras poderão viver: tais se afiguram as do Porto.
Podemos aceitar o campo de aviação na Senhora da Hora: perto do centro da Cidade,
perto de Leixões e perto das estações de caminho de ferro; embora fosse ideal
obter ainda distâncias menores. Não perturbará muito os lugares de residência.
A topografia do Porto não se presta bem
para campos de aviação.
Na Foz do Douro, abaixo da Arrábida, os hidroaviões têm pousado. — Necessário prever desembarcadouro e as instalações anexas — se valer a pena.” (Ezequiel de Campos, Prólogo ao Plano da Cidade do Porto 1932)
Em 21 de março de 1935 é fundado o Aero Club do Porto.
“Sem dúvida também, como complemento da rede de comunicações, não tardará a dotar-se o Porto com as condições indispensáveis à sua comunicação nacional e internacional pela via aérea. Não faz sentido que núcleo como este, obrigado a intensivas relações económicas, - a época é da velocidade e o tempo, mais que nunca é dinheiro -, se encontre impossibilitado de servir-se, com facilidade e rapidez, das grandes carreiras aéreas internacionais, à falta de aviões que entronquem com aquelas linhas.” (Cupertino de Miranda in Carlos Bastos e outros - Nova Monografia do Porto – Companhia Portuguesa Editora, L.da – Porto 1938)
Mas, só em 1945 a 3 de Dezembro é inaugurado o aeroporto do Porto com o nome de Aeroporto De Pedras Rubras, que em 1990 passa a designar-se por aeroporto Francisco Sá Carneiro. Em 2005/6 é construído o actual terminal.
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