quarta-feira, 21 de maio de 2025

A “Exposition Internationale des Arts Décoratifs et Industriels Modernes” Paris 1925. 5

 

Os Pavilhões e as participações dos Países

 A Itália e a União Soviética

Dos países que que participaram na Exposição e que edificaram pavilhões nacionais (que abordaremos no fim) dois merecem destaque.

A Itália e a União Soviética, quer nos seus Pavilhões, quer no conteúdo dos respectivos stands do Grand Palais, ou na Esplanada dos Inválidos, apresentaram com grande sucesso das suas representações, afirmando as suas antagónicas convicções na política e na Arte.

H. Martinie (1881-19?) na revista Art et Décoration, aponta esta divergência de concepções.

“No Cours-la-Reine, os pavilhões de Itália e da República Soviética erguem-se lado a lado.

O acaso proporcionou essa ligação instrutiva. Por um lado, uma apropriação faustosa e inteligente dos estilos tradicionais; por outro, a construção económica, com os materiais mais vulgares, com uma montra vasta e arejada, utilitária na sua lógica e que evita qualquer procura de estilo e de qualquer efeito artístico.” [1]

Assim o Pavilhão de Itália do professor Armando Brasini-Roux (então com 46 anos), afirma, uma espécie de “rappel a l’orde”, ou seja, um regresso à tradição e à história, uma arquitectura clássica e decorada.

Por outro lado, o Pavilhão Soviético de Konstantin Melnikov (com 34 anos) baseia-se numa radical desconstrução da “caixa”, criando espaços definidos por planos sem qualquer decoração além da utilização da cor.

Correspondem a dois países e a dois novos regimes, aliás de ideologia antagónica, e que procuravam uma Arte e uma Arquitectura, que melhor exprimisse a natureza do regime e os ajudasse na sua propaganda e consolidação.



[1] “Au Cours de la Reine les pavillons de l'Italie et de la République des Soviets s'élèvent côte à côte. Le hasard seul provoqua ce rapprochement instructif. D'un côté, une appropriation fastueuse et intelligente de styles traditionnels ; de l'autre la construction économique, à l'aide des matériaux les plus communs, d'une vitrine vaste et aérienne, utilitairement logique et qui bannit toute recherche de style et tout effet d'art.” Art et Décoration n. º 287, Novembre 1925 (pág.181). Source Gallica BnF.


O pavilhão de Itália

“Não peças a fórmula que possa abrir mundos,
e sim alguma sílaba torcida e seca como um ramo.
Hoje apenas podemos afirmar
o que não somos, o que não queremos.”
[1]

Eugenio Montale [2]

 

O Pavilhão de Itália (na planta com o n, º 83), ironicamente situado junto do pavilhão soviético e também situado ao lado do pavilhão do Turismo de Mallet-Stevens, foi projectado pelo arquitecto e professor Armando Brasini-Roux (1879-1965).


fig. 1 - Progetto dell'architetto Armando Brasini per il Padiglione Italiano all' Esposizione di Parigi del 1924: piante, prospetti, sezioni, particolari decorativi e costruttivi. 16 copie su carta. Collezioni storiche del Politecnico di Torino

 Com grande sucesso e admiração do público apesar de contrariar a quase totalidade da Exposição construída com materiais efémeros e removíveis, era - como se costuma dizer - “de pedra e cal”, incluindo a generosa utilização de materiais nobres como o mármore, tornando-se - como afirma o Guia da Exposição - “uma colossal catedral; não é um Pavilhão…é um Palácio. [3]



fig. 2 -
O Pavilhão de Itália de Armando Brasini-Roux. In L’Intransigeant & Tourisme de 25 Mai 1925.

 Ou como afirma o  jornal "L’intransigeant" em 25 de Maio, na tardia data da inauguração do pavilhão:

“De todos os pavilhões estrangeiros, o italiano é o maior e mais importante. Quatrocentas toneladas de mármore, madeira, ferro forjado e esculturas vieram de Roma para construir esta bela construção, sumptuosamente mobilada e decorada…” [4]

 O sucesso do ostensivo Pavilhão Italiano contribuiu para a polémica entre os que admiravam o austero classicismo da sua arquitectura e os que o criticavam por não ser tão moderno como devia, para uma Exposição que pretendia afirmar “a arte do século XX”.


fig.
3 – O público no Pavilhão de Itália. Library RIBA.


De assinalar que a participação italiana acontece precisamente no ano da afirmação do regime fascista (iniciado em 1922), já que Benito Mussolini (1883-1945), em 3 de Janeiro de 1925, assumiu a chefia do Estado, suprimindo os partidos e tornando-se líder absoluto do regime fascista com a designação de il Duce.

Na Itália, com o regime Fascista, a que aderem os Futuristas de antes da Guerra, inicia-se o debate do que devia ser a Arte e a Arquitectura Fascistas, uma viva e prolongada discussão que se alarga à Arquitectura, entre tradicionalismo e modernismo, que durará até à segunda Guerra Mundial.

No ano seguinte à Exposição Mussolini declara:

“Depois de ter observado como, mesmo durante o Risorgimento, na época em que a Itália estava dividida, a sua arte era um privilégio e uma glória para ela, acrescentou que hoje, em que todas as condições mais desejadas pelos grandes italianos, e em primeiro lugar e fundamental, a unidade, foi alcançada, e pode desenvolver-se na nossa terra, uma grande Arte, que inclui em si mesma e, por sua vez, informa todas as manifestações da vida, uma arte que deve ser tradicionalista e ao mesmo tempo moderna, que deve olhar para o passado e ao mesmo tempo para o futuro. Não devemos permanecer contemplativos, não devemos explorar a herança do passado. Devemos criar uma nova herança para colocar ao lado da antiga; devemos criar uma nova arte, uma arte do nosso tempo, uma arte fascista." [5]

 E na “Architettura Italiana”:

“Inspirado na arte antiga de Roma até o Renascimento e adaptado às necessidades modernas. O edifício tem 20 metros de altura e 45 metros de comprimento e sua fachada frontal está voltada para a grande esplanada na entrada da Ponte Alexandre III. Sobre a porta, o arquiteto fundiu os emblemas italianos num novo brasão: a águia romana vira-se para olhar a coroa de ferro que ostenta o fatídico Fert entre uma guirlanda de folhas de louro. [...] A construção foi concluída no curto período de seis meses. Mais de 300 toneladas de material foram transportadas de Roma e Florença, então a marca italiana é tão pura e genuína quanto se pode imaginar.” [6]



[1] Eugenio Montale (1896-1981), Non chiederci la parola…in Ossi di Sepia, Piero Gobetti Editore Torino, 1925.

Non chiederci la parola che squadri da ogni lato
l'animo nostro informe, e a lettere di fuoco
lo dichiari e risplenda come un croco
perduto in mezzo a un polveroso prato.
Ah l'uomo che se ne va sicuro,
agli altri ed a se stesso amico,
e l'ombra sua non cura che la canicola
stampa sopra uno scalcinato muro!
Non domandarci la formula che mondi possa aprirti,
sì qualche storta sillaba e secca come un ramo.
Codesto solo oggi possiamo dirti,
ciò che non siamo, ciò che non vogliamo.

[2] Eugenio Montale (1896-1981), publicou o seu primeiro livro Ossi di Sepia, precisamente no ano da Exposição das artes decorativas em Paris. 50 anos depois será Prémio Nobel.

[3]  “une colossale cathédrale, ce n’est pas un Pavillon…C’est un Palais”. Italie (com o n. º 83) no Paris Arts Decoratfs 1925. Guide de l’Exposition Librairie Hachette Paris 1925. (pág. 288).

[4] “De tous les pavillons étrangers, celui de l’Italie est le plus grand et le plus importante. Quatre cents tonnes de marbres, de boiseries, de fers forgés et de sculptures sont venues de Rome pour édifier cette belle construction, somptueusement meublée et décorée…” L’Intrasigeant 25 de Maio de 1925.

[5] Dopo aver rilevato come anche nel Risorgimento, ai tempi in cui l’Italia era divisa, la sua arte era un privilegio e una gloria per essa, ha aggiunto che oggi, in cui tutte le condizioni più auspicate dai grandi italiani, e prima e fondamentale, l’unità, si sono realizzate, può svilupparsi nella nostra terra, una grande Arte che comprenda in sé e a sua volta informi, tutte le manifestazioni della vita, un’arte che deve essere tradizionalista e al tempo stesso moderna, che deve guardare al passato e al tempo stesso all’avvenire. Noi non dobbiamo rimanere dei contemplativi, non dobbiamo sfruttare il patrimonio del passato. Noi dobbiamo creare un nuovo patrimonio da porre accanto a quello antico ; dobbiamo creare un’arte nuova, un’arte dei nostri tempi, un’arte fascista. Mussolini, Discorso all’Accademia di Belle Arti di Perugia 5 de Ottobre 1926. In Critica Fascista, n. 2 15 de ottobre 1926. E no jornal do regime Il Popolo d'Italia.de 7 Ottobre 1926. 

[6] Ispirato dall’arte antica di Roma al Rinascimento e adattata alle necessità moderne. L’edificio misura 20 metri di altezza su 45 di lunghezza e guarda con la facciata anteriore al grande spiazzo all’ingresso del Ponte Alessandro III. Al di sopra della porta l’architetto ha fuso gli emblemi italiani in uno stemma nuovissimo: l’aquila romana si volge a guardare la corona ferrea che reca il fatidico Fert tra una ghirlanda di foglie di alloro. [...] La costruzione è stata ultimata nel breve periodo di sei mesi. Oltre 300 tonnellate di materiale sono state trasportate da Roma e da Firenze e così l’impronta italiana è quanto di più puro e genuino si possa immaginare. Il Padiglione Italiano all’Esposizione Internazionale di Arti Decorative a Parigi in «L’Architettura Italiana», XX, 1925, n° 10, 1º Ottobre 1925 (pág.109 a 111).

Margherita G. Sarfatti [1], uma das responsáveis pela participação italiana, escreve no Catálogo da participação italiana, um texto precisamente intitulado “Art Moderne et Tradition en Italie” sobre o significado da participação italiana e sobre o Pavilhão de Itália, Margherita Sarfatti prossegue no seu texto defendendo-o, inserindo-o na renovação clássica do movimento Novecento [2] a que ela própria pertenceu.

“Um renascimento clássico tem vindo a animar toda a Itália desde a guerra, como um crescer de seiva. O tom e o estilo da vida são afectados por isso, e até o tipo físico da raça, desde a saudação romana com o braço erguido até às formações em coortes da milícia nacional, cujas legiões voltaram espontaneamente aos nomes clássicos.”

E justifica assim o “classicismo” do Pavilhão de Itália:

“(…) aquelas duas colunas, que formam o motivo base da fachada do pavilhão nacional italiano, pelo seu erguer puro e robusto, pela nudez do seu impulso vertical, limpo e perentório, tudo em mármore honesto, abolindo o pessoal, o estuque e a “pinturagem” mentirosa, aparecem-nos francamente no tom da verdadeira modernidade” [3]



fig. 4 - - Pavillon National d’Italie. Détail de la façade. Catálogue Illustré Édité par les soins du commissariat géneral de l’Italie. Paris 1925. (pág. 91).

E Antony Goissaud [4] em “La Construction Moderne” descreve a fachada e elogia o Pavilhão e a Itália, que em paz expõe as suas realizações.

 “No meio da fachada principal um grande motivo ergue-se entre as duas colunas que suportam o entablamento com métopas, mutulas e todos os elementos clássicos. Este motivo enquadra uma porta monumental encimada pela palavra “Itália” em letras vermelhas, e completa-se por duas estátuas ladeando um painel coberto de inscrições latinas coroado por dois anjos esculpidos em baixo-relevo representando “glórias” segurando feixes de litores. A tradução destas inscrições traduz de forma muito imperfeita o delicado e gracioso pensamento italiano; após um longo período de luta e guerra, a paz da felicidade regressou finalmente, restituindo as fronteiras à raça italiana. As suas novas forças permitiram que a Itália se voltasse a erguer e com o coração ao alto, com o todo-poderoso Rei Victor Emmanuel III a favorecê-la, expõe as suas obras perante os seus convidados e amigos no ano de 1925.” :[5]

 


 

fig. 5 - Pavillon d’Italie. Exposition des Arts Décoratifs et Industriels Parris 1925.Wikipedia Commons foto Auguste Leon (1857-1942) Museu Albert Kahn.

 

Em Portugal, Artur Portela no artigo já referido do Diário de Lisboa, sendo um claro defensor de um “modernismo moderado”, ou seja, o tradicionalismo histórico e local temperado pela adaptação aos tempos modernos, entre diversas referências aos pavilhões nacionais, destaca elogiosamente o Pavilhão de Itália, referindo: (…) “Entre as centenas de pavilhões, fabricados com todos os materiais, inconsistentes, portanto, e com tal aparência de ligeiro e efémero, que parecem esboroar–se  ao menor contacto – só um, o da Itália, marca brilhantemente, em força, em glória, em harmonia, em respeito pelas regras da arquitectura clássica, a par de um nítido e moderno espiritrialismo [sic] de forma e concepção.”  [6]



fig. 6 - Exposition des Arts Décoratifs – Pavillon Italien: M. Brasini, Architecte. Façade Principale.Pl. 17. La Construction Moderne Nº 5 (pag.54).



[1] Margherita G. Sarfatti (1880-1961), critica de arte, jornalista, amante de Mussolini. Autora em 1925 do livro publicado primeiro em Inglaterra, The Life of Benito Mussolini, e em 1926 em Itália com o título Dux. Para além de dirigente da participação italiana pertenceu ao Júri de Arquitectura e de Arte e Industria da pedra da Exposição.

[2] O Novecento foi um movimento artístico criado em Milão em 1922/23 a que pertenceram entre outros os conhecidos, Mario Sironi (1885-1961), Felice Casorati (1883-1963), Giorgio De Chirico (1888-1978), o escultor Arturo Martini (1889-1947), e os futuristas Giacomo Balla (1871-1958), Carlo Carrà(1881-1966), Gino Severini (1883-1966), e Giorgio Morandi (1890-1964), e o arquitecto Gio Ponti (1891-1979).

[3]  “Un renouveau classique anime toute l’Italie, depuis la guerre, comme une poussée de sève. Le ton et le style de la vie s’en ressentent, et jusqu’au type physique de la race, depuis la salutation romaine au bras levé jusqu’aux formations en cohortes de la milice nationale, dont les légions remontèrent spontanément aux noms classiques.” (…) “Ces deux colonnes, qui forment le motif-base de la façade du pavillon national italien, par leur jet pur et robuste, par la nudité de leur élan vertical, net et péremptoire, toutes en marbre probe, abolissant le staff, le stuc et le peinturlurage menteur, nous apparaissent bien dans le ton de la vraie modernité.Margherita G. Sarfatti, Art Moderne et Tradition en Italie in la Exposition des Arts Décoratifs et Industriels Modernes 1925 Catálogue Illustré Édité par les soins du commissariat géneral de l’Italie. Paris 1925. (pag. 7 e 8).

[4] Antony (Joseph Pierre Marie Emmanuel) Goissaud (1871-1950)

[5]  “Le milieu de la façade principale est occupé par un grand motif s’élevant entre deux colonnes soutenant un entablement avec métopes, mutules et tous éléments classiques. Ce motif encadre une porte monumentale surmontée du mot “Italia” en lettres rouges, se complète par deux statues flanquant un panneau couvert d'inscriptions latines couronné par deux anges sculptés en bas-relief représentant des “gloires” tenant des faisceaux de licteurs. La traduction de ces inscriptions rend très imparfaitement la délicate et gracieuse pensée italienne, on peut l’exprimer ainsi, mais d’une manière insuffisante Après une longue période de lutte et de guerre, la paix heureuse est enfin revenue restituant ses frontières à la race italienne. Ses forces nouvelles permettent à l’Italie de s’élever encore et le cœur joyeux, le roi tout-puissant Victor-Emmanuel III la favorisant, elle expose ses œuvres, devant ses hôtes et ses amis en l’année 1925.”Antony Goissaud in La construction moderne" du 1º novembre 1925 (pág. 50)

[6] Artur Portela, A Exposição das Artes Decorativas in O Diário de Lisboa de Segunda feira, 29 de Junho de 1925. 


A crítica

 Para além de não corresponder aos critérios da organização da Exposição, e apesar do sucesso junto do público, o Pavilhão da Itália não agradou à crítica especializada.

Bernard Lecache [1] no jornal “Paris – Soir”, denuncia o verdadeiro significado político do Pavilhão, como propaganda do Fascismo, num artigo intitulado “L’Italie fasciste regrette son passé” [2] esclarecendo as condições em que foi construído o Pavilhão de Itália, com os seus autores submetidos às ordens e directrizes de Mussolini.

“O Senhor Brasini, o arquitecto, recebeu, antes de elaborar o seu projecto, algumas instruções que não podia deixar de cumprir. São instruções ditadas por razões de Estado, derivadas da doutrina fascista: glória ao passado que fez de Roma a dona do mundo, pastiche da História, reconstrução teatral da era paleo-cristã.

E prossegue na sua crítica

“A Itália pretende permanecer e até regressar ao seu rico passado. É um método como outro qualquer. Tem é poucas hipóteses de triunfar em Paris.” [3]

 Concluindo que o pavilhão - onde no átrio é exibido um busto de Mussolini -  é apenas esse busto com uma construção à volta. “Le buste ayant fait son petit effet, ils ont mis un pavillon autour.”



fig.
7– Pavillon National d’Italie, Buste de bronze  de Mr. B. Mussolini, par A. Wildt in L’Italie a la Exposition des Arts Décoratifs et Industriels Modernes 1925 Catálogue Illustré Édité par les soins du commissariat géneral de l’Italie. Paris 1925. (pág.95). source Gallica.BnF.

 O busto de Mussolini de Adolf Wildt (1868-1931), é descrito elogiosamente na revista “Arts décoratifs & industriels modernes” como um bronze que “traduz num estilo magistral os traços da vontade do Duce.” [4]  


E refere tratar-se de “um colossal busto de bronze, colocado à altura de um homem sobre um pedestal de onde sobressaíam os seus largos ombros, o que tornava presente, no meio deste esplendor, o animador da nova Itália.” [5]


fig. 8- Adolf Wildt (1868-1931), busto de Mussolini, bronze. 1925 Pavilhão de Itália na Exposição des Arts Décoratifs Paris

 

De assinalar que a participação italiana acontece precisamente no ano da consolidação do regime fascista (iniciado em 1922), já que, Benito Mussolini (1883-1945) em 3 de Janeiro de 1925, assumindo a chefia do Estado, suprime os partidos e tornan-se líder absoluto do regime fascista com a designação de il Duce.

Na Itália, com o regime Fascista, a que aderem os Futuristas de antes da Guerra, inicia-se um longo debate do que devia ser a Arte e a Arquitectura Fascistas, numa viva e prolongada discussão que se alarga à Arquitectura, entre tradicionalismo e modernismo, que durará até à segunda Guerra Mundial.

No ano seguinte à Exposição Mussolini declara:

“Depois de ter observado como, mesmo durante o Risorgimento, na época em que a Itália estava dividida, a sua arte era um privilégio e uma glória para ela, acrescentou que hoje, em que todas as condições mais desejadas pelos grandes italianos, e em primeiro lugar e fundamental, a unidade, foi alcançada, e pode desenvolver-se na nossa terra, uma grande Arte, que inclui em si mesma e, por sua vez, informa todas as manifestações da vida, uma arte que deve ser tradicionalista e ao mesmo tempo moderna, que deve olhar para o passado e ao mesmo tempo para o futuro. Não devemos permanecer contemplativos, não devemos explorar a herança do passado. Devemos criar uma nova herança para colocar ao lado da antiga; devemos criar uma nova arte, uma arte do nosso tempo, uma arte fascista." [6]

E Yvanhoé Rambosson, Secrétaire Général du Comité Général d’Admission. (Exp. des Arts Décoratifs) na “La revue de l’Art” também critica o pavilhão de Itália.

“A Itália também nos desiludiu. Vive de memórias tão sumptuosas que talvez seja difícil e doloroso afastar-se delas. O arquitecto que construiu o seu palácio, o Sr. Brasini, em vez de olhar para o futuro voltou-se para o passado. A estrutura da sua obra remete-nos para a época de Júlio César, a sua decoração evoca o esplendor do Renascimento. Tudo isto não deixa de ser harmonioso, imponente e sumptuoso. Os materiais mais ricos foram abundantemente utilizados aqui. A pedra de Viterbo alia-se ao mármore, ao pórfiro, ao lápis-lazúli, à malaquite e às cerâmicas. Tijolos de ouro cantam um hino ao génio latino na fachada. Hélas!! todos estes esplendores estão fora do nosso programa.” [7]



fig. 9 - O Pavilhão de Itália de Armando Brasini-Roux. La revue de l’Art (pág.165).


E é Roberto Papini (1883-1957) que em “Architettura e Arti Decorative”, melhor critica o Pavilhão de Itália.

“Outras nações dão exemplos de arquitetura folclórica e a Itália, para não se comprometer, finge ignorar que um movimento moderno também existe no nosso país e veste-se com a toga romana com ênfase retórica e fala latim numa longa epígrafe onde o resultado final deveria ser substituído por um discurso mais sincero. É importante alertar os estrangeiros que o pavilhão italiano não representa de forma alguma as tendências mais saudáveis ​​e vivas da nossa arquitetura.

Podemos desaprovar o passadismo retórico do pavilhão italiano na Exposição de Paris, mas não devemos esquecer que este é o único edifício monumental daquela exposição com caixas mais ou menos elegantes. É um reconhecimento que lealmente, lhe devemos, pois notamos o sucesso que ele teve aos olhos do público em geral, um sucesso que não é nem insignificante nem de desprezar. Mas - não nos enganemos - essa monumentalidade e esse sucesso dependem unicamente do facto de que colunas, cornijas, travejamentos, abóbadas, nichos, pilastras e paredes de pedra sólida ou tijolo tenham sido usados. É verdade que aqueles elementos arquitetónicos estão ali dispostos desordenadamente, que há nichos vazios de onde as estátuas fugiram para se refrescar nas proximidades, e que há um vão desperdício de tijolos dourados onde o Palácio dos Doges deveria ter ensinado que dois tons alternados são suficientes para transformar uma parede num brocado; mas esses são os elementos de monumentalidade de todos os tempos, aqueles que a arquitetura moderna até agora não conseguiu substituir no meio de tamanha exibição de geometria sólida. Ou seja, esses são os elementos que Roma, a cidade arquitetónica por excelência, sempre utilizou, combinando o sentido do espaço interno com o da grandeza externa, nos seus monumentos, produtos de um espírito artístico unitário, ao mesmo tempo prático e estético, comedido e audacioso, realista e imaginativo. A missão de equilíbrio da Itália entre o muito antigo e o muito novo é demonstrada até mesmo pelos seus erros.” [8]

 


[1] (Abraham) Bernard Lecache (1895-1968), jornalista fundou em 1927 a LICA (Liga Internacional Contra o Antissemitismo). 

[2] Bernard Lecache, L’Italie fasciste regrette son passé in Paris-Soir 2 Julliet 1921 (pag.1).

[3]  “M. Brasini, l’architecte a reçu, devant que d’établir ses plans, quelques consignes auxquelles il ne pouvait manquer de se plier. Ce sont des consignes dictées par la raison d’État, dérivées de la doctrine fasciste, gloire au passé qui fit Rome maitresse du monde, pastiche de l’Histoire, reconstitution sur le mode théatral de l’époque antéchrétienne.”  “L’Italie entend rester sur place, et même retourner vers son riche passé. C’est une méthode comme une autre. Elle a peu de chances de triompher à Paris.” Bernard Lecache (1895-1968), L’Italie fasciste regrette son passé in Paris-Soir 2 Julliet 1921 (pag.1).

[4] “traduit dans un style magistral les traits volontaires du Duce.” In Arts décoratifs & industriels modernes

[5] “un buste colossal en bronze, posé à hauteur d’homme sur un socle que dépassaient ses larges épaules, rendait présent, au milieu de ce faste, l’animateur de l’Italie nouvelle.” In Arts décoratif & industriels modernes" de 1925.

[6] Dopo aver rilevato come anche nel Risorgimento, ai tempi in cui l’Italia era divisa, la sua arte era un privilegio e una gloria per essa, ha aggiunto che oggi, in cui tutte le condizioni più auspicate dai grandi italiani, e prima e fondamentale, l’unità, si sono realizzate, può svilupparsi nella nostra terra, una grande Arte che comprenda in sé e a sua volta informi, tutte le manifestazioni della vita, un’arte che deve essere tradizionalista e al tempo stesso moderna, che deve guardare al passato e al tempo stesso all’avvenire. Noi non dobbiamo rimanere dei contemplativi, non dobbiamo sfruttare il patrimonio del passato. Noi dobbiamo creare un nuovo patrimonio da porre accanto a quello antico ; dobbiamo creare un’arte nuova, un’arte dei nostri tempi, un’arte fascista. Mussolini, Discorso all’Accademia di Belle Arti di Perugia 5 de Ottobre 1926. In « Arte fascista », Critica fascista, anno IV, n.º 20, 15 ottobre 1926. (pág.383). E no jornal do regime Il Popolo d'Italia.de 7 Ottobre 1926. 

[7] L'ItaIie aussi nous a déçus. Elle vit sur de si somptueux souvenirs qu'il lui est peut-être difficile et pénible de s'en arracher. L'architecte qui érigea son palais, M. Brasini, au lieu de regarder vers l'avenir s'est tourné vers le passé. La structure de son oeuvre nous ramène au temps de Jules César, sa décoration évoque le faste de la Renaissance. Tout cela ne laisse pas d'être harmonieux, imposant et somptueux. Les matériaux les plus riches ont été prodigués ici. La pierre de Viterbe s'allie au marbre, au porphyre, au lapis-lazuli, à la malachite et aux céramiques. Des briques d'or chantent sur la façade un hymne au génie latin. Hélas ! toutes ces splendeurs sont utilisées en dehors de notre programme. Yvanhoé Rambosson La Revue de l’Art (pág.170)

 [8] Noi possiamo disapprovare il passatismo retorico del padiglione italiano all’esposizione di Parigi ma non dobbiamo dimenticare che esso è l’unico edificio monumentale di quella mostra di scatole più o meno graziose. È un riconoscimento che lealmente gli dobbiamo mentre constatiamo il successo caloroso che ha avuto agli occhi del grosso pubblico, successo non trascurabile nè disprezzabile.  Ma - non illudiamoci - quella monumentalità e quel successo dipendono unicamente dal fatto che vi sono adoperate colonne e cornici e trabeazioni e volte e nicchie e paraste e mura di solida pietra o di mattoni. È vero che quegli elementi architettonici vi son posti alla rinfusa, che vi son nicchie vuote da cui le statue son fuggite per frescheggiare lì vicino, che v’è un vano spreco di mattoni dorati là dove il palazzo dei Dogi avrebbe dovuto insegnare che bastan due toni alterni per fare d’una muraglia un broccato; ma essi son pure gli elementi della monumentalità d’ogni tempo, quelli cui nulla l’architettura moderna ha finora saputo sostituire fra tanto sfoggio di solida geometria. Essi sono cioè gli elementi che Roma, la città architettonica per eccellenza, ha sempre usato, accordando il senso dello spazio interno con quello della imponenza esterna, nei suoi monumenti, prodotti di uno spirito artistico unitario, al tempo medesimo pratico ed estetico, misurato ed ardito, realistico e fantasioso. La missione equilibratrice dell’Italia fra vecchissimo e novissimo è dimostrata insomma perfino dagli error.” R. Papini, Le arti a Parigi nel 1925, “Architettura e Arti Decorative”, anno V, fasc. V, gennaio 1926. (pág. 4).


O interior do pavilhão

 O interior do pavilhão ostenta do mesmo modo o uso de materiais “nobres” e decorativos.




fig. 10  - Progetto dell'architetto Armando Brasini per il Padiglione Italiano all' Esposizione di Parigi del 1924: piante, prospetti, sezioni, particolari decorativi e costruttivi. 16 copie su carta. Collezioni storiche del Politecnico di Torino

 

Antony Goissaud refere o vestíbulo e os pormenores da sua decoração.

“Será oportuno fornecer mais amplas informações sobre as obras que adornam ou completam este magnífico vestíbulo: um busto de Mussolini em bronze verdete de Wild *, uns grandes vasos em cobre martelado e em relevo de Granata** de Roma, uns feixes luminosos em vidro veneziano de Capellin***, uns vitrais pintados de Chini**** enquadrando as duas janelas de madeira amarela incrustadas com ornamentos e filetes de madeira verde americana realçados por dois medalhões de bronze dourado com uma admirável composição, um representando dois cavalos e o outro duas gazelas.”  [1] 

 [Adolf Wildt (1868-1931), Giovanni Granata (1875-1947). Giacomo Cappelin (1887-1968) e Paolo Venini (1895-1959) fundaram a Cappellin, Venini & Cie. Murano (Societa Vetri Soffiati Muranesi Cappellin Venini & Cie.) fund. 1921. Aí trabalhou o arquitecto Carlo Scarpa (1906-1978) entre 1927 e 1932. Galileo Chini (1873-1956) Casa Chini e & Cie.manufacture Florence]



fig. 11 - Exposition des Arts Décoratifs – Pavillon Italien: M. Bransini Architecte. Le Grand Vestibule. La Construction Moderne Nº 5 (pág.54).

 No centro do Hall uma enorme taça luminosa de Mario Giovanni Tolleri (1888-1954), referida em Art et Décoration como “a grande taça no hall de entrada que ocupa demasiado o nicho que a alberga.” [2]


fig.
12 - Grande vasque lumineuse de G. Tolleri. Construction moderne n.º 5 du 1 Nov.1925. (pág.49)



[1] Il conviendrait de donner d’ample renseignements sur les oeuvres qui ornent ou complètent ce magnifique vestibule : un buste en bronze vert-de-grisé de Mussolini par Wild, des grands vases en cuivre repoussé et martelé par Granata de Rome, des Gerbes lumineuses en verre de Venise par Capellin, des vitraux peints de Chini garnissant les deux croisées en bois jaune marqueté d’ornements et de filets en bois de ton vert américain rehaussées de deux médaillons en bronze doré d’une admirable composition, l’un représentant deux chevaux, l’autre deux biches. Antony Goissaud La Construction Moderne n. º 5 du 1º Novembre 1925. (pág. 52).

[2] H. Martinie “la grande vasque du hall d'entrée qui encombre quelque peu la niche qui l'abrite.” Art et decoration Julliet- Décembre 1925.Tome XLVIII.  Editions Albert Levy Librairie Centrale des Beaux-Arts. Paris 1925. Source gallica.bnf.fr / Bibliothèque nationale de France.


Os Futuristas no Grand Palais

“Não há beleza, sem ser na luta. Nenhuma obra que não tenha um carácter agressivo pode ser uma obra-prima. A poesia deve ser concebida como um violento assalto contra as forças desconhecidas, para obrigá-las a prostrar-se diante do homem.” Manifesto Futurista [1]

 Margherita G. Sarfatti no Catálogo da participação italiana, no texto “Art Moderne et Tradition en Italie” realça o papel que a Itália atribui à Arte Moderna, com a participação do Futurismo e das vanguardas artísticas de antes da guerra, remetendo-os para o stand de Itália no Grand Palais, e refere, curiosamente, o pavilhão da URSS: “a arte de vanguarda tem as suas duas brigadas extremas no pavilhão dos Sovietes e no stand futurista da Secção italiana no Grand Palais.” [2]

E prossegue analisando a participação dos futuristas:

“Os futuristas, porém, explicam a acção de uma vanguarda jovem e poderosa num país que, fiel ao seu passado, se orgulha do seu presente e que prepara um futuro: são corações ardentes; a sua vontade é impulsiva e tenaz, o vigor da sua arte, da sua fantasia, está profundamente enraizado. Neste vigésimo stand os futuristas, sob a direção do seu líder, Marinetti, expõem muito: painéis, tapetes, teatros, policromias, desenhos e livros; grupos de objectos de madeira, primitivos e eloquentes. Mas o mais impressionante neles é a luz viva que o seu complexo trabalho emite. As cores são vibrantes, vivas; estas são as cores animadoras que compõem uma explosão de idealismo, de esperança, de nova vontade, de jovem italianidade apaixonada pela Arte.” [3]

 Na Secção Italiana do Grand Palais, para além de Filippo Tommaso Marinetti (1876-1944), poeta e escritor, o autor do Manifesto Futurista de 1909, intervieram com salas próprias, os multifacetados pintores, escultores, artistas gráficos e cenógrafos Giacomo Balla (1871-1958), Fortunato Depero (1892-1960) e Enrico Prampolini (1894-1956).

 Em Maio de 1925 é publicado um número da revista NOI, dirigida por Prampolini dedicado à Exposição de Artes Decorativas com obras de Balla, de Depero e Prampolini e ainda do desaparecido Antonio Sant’Elia (1888-1916).

 


fig. 1 – NOI, revista d’arte futurista n. 10/11/12. Maggio 1925 Numero consacré aux peintres Balla - Depero - Prampolini. Exposition Internationale des Arts Décoratifs, Industria Grafiche Roma.

 

No Catálogo da participação da Itália sobre a participação Futurista escreve-se:

“Cada peça que faz parte da exposição teatral futurista traz muitas inspirações, através das curiosas invenções destes directores de cena: - muitas inovações através destes planos combinados e simplificados, através destas sínteses pitorescas e psicológicas espiritualizando a obra dos Poetas.”  [4] 

Giacomo Balla

No Catálogo:

“Balla. - Numerosos painéis decorativos, em tapeçaria. Cores, linhas, luzes, simples e imediatas; sintetismo abstrato, mas muito significativo; Eis o que faz de Balla um dos representantes mais seguros ​​de uma arte que revela novos caminhos.

“Mar, velas, vento”, onde o abstrato é estilizado em formas poéticas com ritmos inesperados: “Génio Futurista”, com o seu desenho acutilante, o impressionante. “Motorumorismo” e todas as outras criações de Balla, são todas definições de um mundo em movimento, ao mesmo tempo que os sintomas indefinidos do dia seguinte que devem ser alcançados.” [5



fig. 14– Gran Palais. Groupe des futuristes italiens. Exposition Giacomo Balla.Rome. Catalogue Illustré Édité par les soins du commissariat géneral de l’Italie. Paris 1925. (pág.165).


Na parte inferior da parede, uma tapeçaria intitulada o « Génio Futurista”, uma composição geométrica em triângulos com cores vibrantes da bandeira italiana sobre um fundo azul, tendo no centro uma figura humana cuja cabeça é uma estrela e para onde convergem as linhas da composição.




fig. 15 - Giacomo Balla Génio Futurista 1925 óleo s/tela 279 x 381 cm. Col. Biagiotti Italia.

 

Na parte superior uma outra tapeçaria intitulada “Mare velivolato”, no Catálogo em francês Mer, voiles, vent”.

Aqui Giacomo Balla utiliza formas curvas para representar a dinâmica do mar. A impossibilidade de realisticamente pintar o vento, é aqui resolvida pelas velas e por curvas em forma de leque que pretendem dar uma ideia dinâmica das refregas de vento.

 



fig. 16 - Giacomo Balla Mare velivolato (“Mer, voiles, vent” ) tapeçaria 279 x 381 cm. col. Banca d’Italia.

 

Fortunato Depero

 No Catálogo:


“Depero. — Tapeçarias, pinturas, modelos, tecidos, desenhos para xailes, esboços para móveis e almofadas, constituem um todo muito considerável devido ao desenho que o determina; tanto quanto pelo trabalho que o produz. Estes mosaicos de tecido são impecáveis; as assonâncias e dissonâncias técnicas, na harmonização geral das cores, fazem com que os pormenores adquiram qualidades vivas, num todo triunfante. Depero é o autor do grupo Hommes aux Marteaux. Estas belas marionetas estão cheias de coragem e consciência. A Casa de Arte Futurista Depero, em Rovereto, é a fábrica de onde emerge todo um mundo de coisas, cada uma das quais, inventada com entusiasmo, é executada com mestria.”  [6]




fig. 17 - Gran Palais. Groupe des futuristes italiens. Exposition Fortunato Depero Rovereto. Catalogue Illustré Édité par les soins du commissariat géneral de l’Italie. Paris 1925. (pág.167).

 Em primeiro plano a escultura futurista em madeira “Martellatori macchina” (máquina de marteladores) em que duas filas de 6 idênticas figuras em pleno esforço do gesto de martelar, se assemelham a uma máquina ou a um motor de 6 cilindros.



fig. 18 – Fortunato Depero, Martellatori macchina [Machine Hammerers], 1925. Fotografia autor anónimo gelatin silver print on fiberbased paper, 30.5 x 40 cm. Casa d'Arte Futurista Depero MART Rovereto Museo di arte moderna e contemporánea di Trento.

 À direita na imagem do stand de Depero, uma paisagem rural, a tapeçaria Serrada, tecida à mão no atelier da Casa de Arte Futurista criada por Depero em Rovereto.  

 Serrata é uma vila de Reggio de Calabria na Itália onde Depero passava algumas temporadas.


 fig. 19 – Fortunato Depero, "Serrada", tarsia in panni Rovereto, Casa Depero.

 E na parede em frente uma outra tapeçaria intitulada “Velocità moderne”, um tema do agrado dos Futuristas, Noi affermiamo che la magnificenza del mondo si è arricchita di una bellezza nuova: la bellezza della velocità”  [7], onde por uma curva dinâmica e gestual, estrada ou caminho de ferro, estão hierarquizados três tipos de transporte mecânico. Nessa curva, em cima voa um aeroplano de grande hélice; em baixo desce um comboio soltando grandes espirais de fumo.

E lembrando o ponto 5 do Manifesto Futurista “Noi vogliamo inneggiare all'uomo che tiene il volante, la cui asta ideale attraversa la Terra, lanciata a corsa, essa pure, sul circuito della sua orbita” [8], um automóvel aberto atravessa a meio, com duas personagens que são bonecos de madeira, assim como os peões que nas margens saúdam as três máquinas..

 



fig. 20 – Fortunato Depero, Velocità moderne, 1925

 

 Enrico Prampolini

 No Catálogo:

“Prampolini. — Entre Balla e Dépéro, Prampolini apresenta alternadamente painéis grandes e pequenos. — “fantasia negra”, “Rua vista de cima”, “Casas e ruas vistas à noite” executadas em alta urdidura, tipicamente originais na composição, nas cores e nas nuances, diferem tanto na ideia como no método e nos meios, do trabalho dos outros expoentes deste mesmo grupo.”  [9]



fig. 21 - Gran Palais. Groupe des futuristes italiens. Exposition Enrico Prampolini Rome.  Catalogue Illustré Édité par les soins du commissariat géneral de l’Italie. Paris 1925. (pág.169) source Gallica. BnF

 

 Prampolini na secção italiana do Grand Palais expôs três maquettes: uma representa a cena giratória tripartida e simultânea criada em Praga durante as celebrações de Dante no início da década de 1920; as outras duas estão dentro de uma estrutura arquitectónica que faz lembrar as letras “T” e “M”, iniciais do seu “Teatro Magnético”, que obteve o Grande Prémio do Teatro, e ainda medalhas de prata pela Decorazione”, pela “Architettura” e pela “Arte della Strada” conferidas pelo júri da Exposição Internacional de Artes Decorativas de Paris em 1925.

 O Teatro Magnético diz o próprio Prampolini “consiste num complexo plástico composto por construções móveis por si próprias, superfícies coloridas e arquiteturas luminosas. A voz humana, impessoal e sem conotações psicológicas, e o palco num estado constante de ativação elétrica são os elementos essenciais de atração espiritual e visual, que medem o tempo da ação no espaço cénico, substituindo a efígie da realidade exterior por uma consistência autossuficiente, electrificada e dinamizada.” [10]









fig.
22 - Grand Palais. Groupe des futuristes italiens. Théâtre de Prampolini. Catálogue Illustré Édité par les soins du commissariat géneral de l’Italie. Paris 1925. (pág.171). source Gallica. BnF.




fig. 23 – Prampolini Architettura externa del « Teatro magnetico » in Gino Gori (1876-1952), Scenografia. La tradizione e la rivoluzione contemporanea, Editrice Alberto Stock, Roma 1927, (pág. 219).

 

O Júri considerou “A exposição do Sr. Prampolini não é de forma alguma, inferior à exposição da Secção Russa. Pode-se mesmo acrescentar que algumas das reformas da arte cénica russa foram significativamente influenciadas pela escola futurista, da qual o Sr. Prampolini é o principal representante. (…)  Os reformadores do teatro moderno, ao dirigirem cada vez mais a sua atenção para os elementos materiais da cena (encenação, iluminação, etc.), foram diminuindo gradualmente a importância do actor, considerando-o mais como um elemento subordinado ao conjunto da representação.(…) Os futuristas reduziram ainda mais o seu papel. Finalmente, o Sr. Prampolini nos seus últimos esforços – “cenoplástica”, “cenodinâmica”, “espaço cénico polidimensional” e teatro magnético – considerou o palco – o “espaço”, como ele diz – como o elemento mais importante de uma representação teatral.”

 E o júri justifica a sua decisão:

 “É justo conceder a mais alta recompensa àquele desses representantes que, na sua área, mais completamente concretizou as tendências e as concepções da escola a que pertence.” [11]


Mas a participação italiana não se resumiu ao Pavilhão nem às salas Futuristas do Grand Palais e da Esplanada dos Inválidos.

Foram expostas diversas criações, artesanais e industriais, nas artes do vidro, da cerâmica, dos têxteis, dos metais, da joalharia, do livro, da moda, e do mobiliário.

Contudo, e apesar da extraordinária qualidade, apresentam um desenho ou ligado ao renascimento moderno de temas e modelos do passado, ou a uma dimensão vernácula ou às diversas tradições locais.

Não contribuiram, de um modo geral, para o aparecimento de novas formas que se adaptassem às novas necessidades da vida quotidiana, embora temham aberto a muitos criadores a via para um desenho inteiramente moderno na década seguinte.

E para concluir, Margherita G. Sarfatti procura justificar toda a participação italiana. “Que nos seja permitido, contudo, reivindicar o dom de um pouco de beleza para suavizar, enriquecer e até enobrecer a áspera matéria, um pouco de sorriso e encanto para a vida quotidiana, onde o supérfluo é indispensável, pois mesmo o selvagem consente em prescindir da caça, mas não das plumas para inspirar quer o amor ou o medo.” [12]

 CONTINUA



[1] « Non v'è più bellezza, se non nella lotta. Nessuna opera che non abbia un carattere aggressivo può essere un capolavoro. La poesia deve essere concepita come un violento assalto contro le forze ignote, per ridurle a prostrarsi davanti all'uomo Ponto 7 do Manifesto Futurista de Filippo Tommaso Marinetti, Manifesto del Futurismo, depois publicado em Francês no jornal Le Figaro em 20 de Fevereiro de 1909.

[2] “ l’art d’avant-garde à ses deux patrouilles extrêmes au pavillon des Soviets et dans le stand futuriste de la Section italienne au Grand Palais.” Margherita Grassini Sarfatti, Art Moderne et Tradition en Italie in l’Exposition des Arts Décoratifs et Industriels Modernes 1925 Catalogue Illustré Édité par les soins du commissariat géneral de l’Italie. Paris 1925. (pág. 7 e 8). source Gallica. BnF

[3] “Les futuristes expliquent, pourtant, l’action d’une jeune et puissante avant-garde dans un pays qui, fier de son passé, s’enorgueillit de son présent qui prépa rent un avenir : ce sont des cœurs ardents ; leur volonté est impulsive et tenace, la vigueur de leur art, de leur fantaisie, est profondément racée. Dans ce vingtième stand les Futuristes, sous la di rection de leur chef, Marinetti, exposent beaucoup : des panneaux, des tapis, des théâtres, des polychromies, des dessins et des livres ; des groupes en bois, primitifs et éloquents. Mais ce qui frappe davantage, chez eux, c’est la vive lumière que dégage leur œuvre complexive. Les couleurs sont vibrantes, vivantes ; ce sont des cou leurs animatrices composants un éclat d’idéalité, d’espérance, de volonté nouvelle, de jeune italianité passionnée d’Art.” Margherita G. Sarfatti In Catalogue Illustré Édité par les soins du commissariat général de l’Italie. Paris 1925. (pág. 47)

[4] Chaque pièce faisant partie de l’exposition théâtrale futuriste fournit bien des inspirations, par les curieuses inventions de ces réalisateurs scéniques : - bien des novations par ces plans combinés et simplifiés, par ces synthèses pittoresques et psychologiques spiritualisant l’oeuvre des Poètes. l’Exposition des Arts Décoratifs et Industriels Modernes 1925 Catalogue Illustré Édité par les soins du commissariat géneral de l’Italie. Paris 1925. (pág. 49).

 [5] Balla. — De nombreux panneaux décoratifs, en tapisserie. Couleurs, lignes, lumières, simples et immédiates ; synthétisme abstrait, pourtant très significatif ; voilà ce qui fait de Balla un des plus sûrs représentants d’un art révélateur de nouvelles routes. « Mer, voiles, vent » —- où l’abstrait se stylise dans des formes poétiques aux rythmes inattendus : — « Génie Futuriste », au dessin aigu, au « Motorumorisme» impressionnant et toutes les autres créations de Balla, sont autant de définitions d’un monde en marche, en même temps que les symptômes indéfinis du lendemain qu’il faut atteindre.in  l’Exposition des Arts Décoratifs et Industriels Modernes 1925 Catalogue Illustré Édité par les soins du commissariat géneral de l’Italie. Paris 1925. (pág. 48)

 [6] Depero. — Tapisseries, tableaux, maquettes, étoffes, dessins pour châles, esquisses pour meubles et coussins, composent un tout très considérable à cause de la conception qui le détermine; autant qu’à cause du travail qui le produit. Ces mosaïques d’étoffes sont impeccables ; les assonances et les dissonances techniques, dans l’harmonisation générale des couleurs, font que les détails acquièrent des qualités vivantes, dans un ensemble triomphal. Dépéro est l’auteur du groupe des Hommes aux Marteaux. Ces superbes pantins sont pleins de courage et de conscience. La Maison d’art futuriste Dépéro ,de Rovereto, est l’usine d’où sort tout un monde de choses dont chacune, inventée dans l’enthousiasme, est exécutée avec maîtrise. In l’Exposition des Arts Décoratifs et Industriels Modernes 1925 Catalogue Illustré Édité par les soins du commissariat géneral de l’Italie. Paris 1925. (pág. 48).

 [7] Filippo Tommaso Marinetti, Manifesto del Futurismo 1909.

[8] Filippo Tommaso Marinetti, Manifesto del Futurismo 1909.

 [9] Prampolini. — Entre Balla et Dépéro, Prampolini à son tour, présente de grands et petits panneaux. — « Fantaisie nègre », « Une rue vue d’en haut », « Maisons et rues vues la nuit » exécutés en haute-lisse, typiquement originaux comme composition, comme couleurs, et comme nuances, diffèrent par l’idée autant que par la méthode et par les moyens, de l’oeuvre des autres exposants de ce même groupe. In l’Exposition des Arts Décoratifs et Industriels Modernes 1925 Catalogue Illustré Édité par les soins du commissariat géneral de l’Italie. Paris 1925. (pág. 49).

 [10] “consiste in un complesso plastico formato da costruzioni mobile e semoventi, superfici colorate e architetture luminose. La voce umana, impersonale e senza connotati psicologici, e il palco posto in perenne stato di attivazione elettrica sono gli elementi essenziali dell’attrazione spirituale e visiva, che misurano il tempo dell’azione nello spazio scenico sostituendo all’effigie della realta esterna una consistenza autosufficiente, elettrificata e dinamizzata.” E. Prampolini, Il teatro magnetico, s.d. [ma1925]; in Gino Gori (1876-1952), Il Teatro Magnetico di Prampolini. Scenografia. La tradizione e la rivoluzione contemporanea, Editrice Alberto Stock, Roma 1927. (pág. 219).

 

 

 

[11] “L’exposition de M. Prampolini ne le cède en rien à l’exposition de la Section russe. On pourrait même ajouter que certaines des réformes de l’art scénique russe ont été sensiblement influencées par l’école futuriste, dont M. Prampolini est le principal représentant. (…) Les réformateurs du théâtre moderne, en dirigeant leur attention de plus en plus sur les éléments matériels de la

scène (mise-en-scène, éclairage, etc.), ont graduellement diminué l’importance de l’acteur en le considérant de plus comme un élément subordonné à l’ensemble de la représentation. (…) Les futuristes en ont réduit le rôle encore davantage. Finalement, M. Pamprolini dans ses derniers efforts – la « scenoplastique », a »scenodynamique », « l’espace-scénique polydimensionel » et le théâtre magnétique – a pris la scène – « l’espace » comme il dit – comme l’élément le plus important d’une représentation théâtrale. »

« Et il n’est que juste d’attribuer la plus haute récompense à celui de ces représentants qui, dans son domaine, a le plus complétement réalisé les tendances et les conceptions de l’école à laquelle il appartient. » Acta do Júri in Gino Gori (1876-1952), Il Teatro Magnetico di Prampolini. La tradizione e la rivoluzione contemporanea, Editrice Alberto Stock, Roma 1927.

 (pág. 217 e 218)

[12] Qu’il nous soit permis pourtant de réclamer le don d’un peu de beauté pour adoucir, enrichir et même ennoblir l’âpre matière, un peu de sourire et de charme pour la vie de tous les jours, où le superflu est indispensable, puisque le sauvage consent à se passer de gibier mais non de plumes pour inspirer l’amour ou la crainte. Margherita G. Sarfatti Art Moderne et tradition en Italie. In Catalogue Illustré, L’Italie A l’Exposition Internationale des Arts Décoratifs et Industriels Modernes Paris 1925.Ed. Comissariat Général de L’Italie. (pág. 12)

 

 



Sem comentários:

Enviar um comentário