quinta-feira, 23 de outubro de 2025

Janela 3

 

A janela aberta para respirar

É a janela que permite um respirar feliz.

Por isso o poeta brasileiro Mário Quintana compara a janela aberta com o poema já que ambos nos fazem felizmente respirar.

“Quem faz um poema abre uma janela.
Respira, tu que estás numa cela abafada,
esse ar que entra por ela.
Por isso é que os poemas têm ritmo
- para que possas profundamente respirar.
Quem faz um poema salva um afogado.”
[1]

Para mostrar como uma janela aberta, como um poema, faz respirar, o cubista Juan Gris pinta um quadro intitulado A Janela Aberta onde o subtil pormenor da nuvem que entra é disso testemunho.


fig. 1- Juan Gris (José Victoriano Carmelo Carlos González-Pérez 1887-1927). A  janela aberta 1921, óleo s/tela 66 x 100 cm. Museo Nacional Reina Sofia Madrid.

E Juan Gris ao pintar uma guitarra pousada sobre pautas parece querer fazer ouvir a música que faz vibrar o ar.

E sente-se e respira-se o cheiro das outonais castanhas junto com o odor da maresia, que a janela aberta deixa entrar vindo do mar calmo.

Finalmente Paul Klee pinta uma janela aberta, com uma austera caixilharia de ferro (própria dos anos 30) por onde se respira o ar do mar do Norte.

 


 fig. 2 - Paul Klee (1879-1940). Fensterausblick (Nordseeinsel), Vue d’une fenêtre (Ile de la mer du Nord), 1923. Aguarela e guache sobre papel e cartão 33 x 22,5 cm. Col. particular.

E o poeta Rainer Maria Rilke questiona esta estranha janela que o convida a esperar.

Propões-me estranha janela eu esperar;
Já quase se move a tua cortina bege.
Devo eu, ó janela, ao teu convite me render?
Ou me defender, janela? Quem vou eu esperar?
Não sou eu intocável, com esta vida que escuta,
Com este peito tão cheio que a perda completa?
Com esta estrada que defronte passa, e a dúvida
Que tu possas também dar esse excesso que o sonho
me faz parar?”
 
[2]





[[1] Mário (de Miranda) Quintana (1906-1994), Emergência in Apontamentos de história sobrenatural Ed. Globo S. Paulo 2005. (pág. 46)

.2] Rainer Maria Rilke (1875-1926), Fenêtre Étrange de La Fenêtre (1924-25), in Œuvres poétiques et theatrales, Colection de la Pléiade Gallimard, Paris 1987. (pág.1104).

“Tu me proposes, fenêtre étrange, d’attendre;
Déjà presque bouge ton rideau beige.
Devrais-je, o fenêtres, a ton invite me rendre?
Ou me défendre, fenêtre? Qui attendrais-je ?
Ne suis-je intact, avec cette vie qui écoute,
Avec ce coeur tout plein que la perte complète?
Avec cette route qui passe devant, et le doute
Que tu puisses donner ce trop dont le rêve
m’arrête?”


Sem comentários:

Enviar um comentário